Revisão
Abstract
Disnfunções Cicatricias Hiperploliferativas: Cicatrizes Hipertrofica - Parte 2
IntroduçãoQueloide é uma cicatriz espessa e elevada, de superfície bocelada ou lisa, e de coloração variando entre cor de pele, avermelhada e hipercromica. São lesões geralmente limitadas à derme cutânea, exceto raros casos em que ocorre no epitélio da córnea (Síndrome de lowe)1. Devido ao fato de crescer e invadir tecidos vizinhos, 0 queloide é considerado por pesquisadores como uma neoplasia benigna.O queloide foi descrito ha mais de três milênios nos Papiros de Smith, o qual descreve técnicas operatórias usadas em cerca de 1.700 a.C2. Outras referências ao queloide podem ser encontradas no 10° século da nossa era, em escritas da Tribo Yoruba do oeste da Nigéria, que simbolizaram estas lesões em esculturas. Foram e são fartamente descritas na Medicina folclórica africana2 Porém, quem primeiro as descreveu na literatura científica foi Jean Louis Alibert em 1806, denominando-as "cancroide", termo posteriormente substituído por "queloide" (do grego: kelth = tumor + eidoz = forma), para evitar confusão com o câncer e suas conotações3. Desde então, inúmeros têm sido os esforços da ciência na tentativa de resolver esse distúrbio importante do processo cicatricial. O queloide assume sua maior relevância na Cirurgia Plástica, apesar da crescente tendência da maioria das especialidades cirúrgicas também se preocuparem com a estética dos resultados.Estatísticas nos Estados Unidos demonstram prevalência de 1,5% de pessoas portadoras de queloide, em relação à população total. Na África, as estatísticas chegam a demonstrar alta prevalência, girando em torno de 6%4. No Brasil, o queloide é uma lesão frequente, apesar de não existir estatísticas precisas sobre o assunto3.A frequência maior encontra-se em pacientes jovens, entre 10 e 30 anos, com risco maior na segunda década de vida1,5. É raro em crianças e idosos, apesar de existir relato dessa lesão até em cicatriz umbilical de recém nascido", assim como em pessoas de 73 anos de idade7,8.O queloide ocorre com predisposição maior em pessoas do sexo feminino em relação ao masculino3. Relata-se quase o dobro (1,8/1) de incidência em mulheres, em relação a homens9, embora alguns pesquisadores não tenham encontrado correlação entre o risco de desenvolver queloide em relação ao sexo1,2.Esse distúrbio de cicatrização é significativamente mais frequente em pessoas de etnia negroide (negros e pardos) e mongoloide (amarelos ou orientais). Pesquisas indicam a prevalência em indivíduos negroides em relação a caucasoides, variando de 6:1 até 19:14.Fisiopatogenia e fatores de riscoAcredita-se, atualmente, que não existe queloide espontâneo, e que as lesões sem causa aparente são provocadas por ferimentos puntiformes não percebidos pelo paciente, como pequenas pústulas, acne ou até picada de insetos7,10. A etiologia desse distúrbio ainda está insuficientemente esclarecida.Apesar da compreensão, até o presente momento, sobre os mecanismos in vitro a respeito da biologia da cicatrização, ainda não se sabe o bastante sobre as ações biológicas desses fatores no queloide in vivo. Um problema chave que contribui para essa dificuldade, reside no fato do queloide ser descrito apenas em seres humanos, fator que tem tornado a pesquisa experimental in vivo do queloide ainda muito incipiente1,5,11,12,13. Apesar de ser classificado como uma disfunção cicatricial hiperproliferativa, o queloide é caracterizado pela hiperprodução de colágeno, e secundariamente, por uma hiperproliferação de Fibroblastos na derme. O fibroblasto, secretando colagenase, manteria o balanço síntese/degradação da cicatriz, regulando seu tamanho, que a neoformação colágena pode manter-se normalmente por ate 12 meses. O período critico do processo de cicatrização, quando o equilíbrio entre a síntese e a lise de colágeno se desfaz, geralmente ocorre na 3ª ou 4ª semana apos a lesão. Nesse momento, por motivo ainda não esclarecido, nos casos de queloide, a síntese torna-se maior que a lise, ou esta menor que a síntese, por tempo indefinido¹.A literatura aponta varias modalidades de pesquisa a procura da etiopatogenia do queloide. Evidências genéticas definitivas quanto ao queloide ainda não ficaram comprovadas. Sugeriu-se a hipótese de que a suscetibilidade ou risco pessoal em desenvolver queloide poderia ser apenas um Fator predisponente, e não um fator de herança genética determinante propriamente dita³.Evidências endócrinas apontam um aumento significativo de incidência de queloide na puberdade, num período de exaltação e amadurecimento do eixo hipofisário-gonadal e a exacerbação do queloide durante a gestação, com uma relativa regressão na menopausa1,5.O Hormônio Estimulante dos Melanocitos (HEM), também conhecido por Hormônio Melanotrofico ou Melanotrofina, também poderia influir na Formação do queloide3. O queloide é mais frequente em regiões da pele onde ha maior concentração de melanocitos5. Áreas pouco pigmentadas e com deficiência de glândulas sebáceas são, raramente, locais de queloide. Essa lesão também é quase inexistente na planta do pé e na palma da mão, mesmo em pessoas portadoras de cicatrizes queloideanas, apesar dessas regiões estarem constantemente sujeitas a atritos e Ferimentos. O queloide tampouco foi descrito em pessoas albinas5. Paradoxalmente, o fator melanocitico, propriamente dito, esta ausente ou presente em quantidades ínfimas em lesões queloideanas3.Evidências vasculares também demonstram que pacientes com hipertensão arterial severa, mais frequentes na população negra, apresentam uma incidência com significância estatística maior para apresentar queloide, em relação a indivíduos com pressão arterial normal, tanto em pessoas negroides ou caucasoides4,14. Esse tipo de hipertensão arterial, que responde ao enalapril (enzima inibidora da conversão da angiotensina ll), demonstrou resultados favoráveis no sentido de regredir casos de queloide durante o tratamento da hipertensão severa pelo medicamento, a despeito dessas lesões não serem responsivas a maioria dos tratamentos.As pesquisas envolvendo evidências imunológicas revelam que a lgE também poderia participar no queloide, à medida que o nível sérico dessa imunoglobulina esta diretamente relacionado ao nível de histamina mastocitaria aumentada no tecido queloideano; pessoas com alergias são mais frequentemente encontradas nos portadores de queloide, em relação as pessoas com cicatrização normal“. Ainda, pessoas do grupo sanguíneo A tem mostrado maior predisposição ao queloide5. Entretanto, soa os estudos dos fatores de crescimento que estão atualmente em destaque na literatura médica. Demonstrou-se que o Transforming Growth F actor-beta (T GF-â)4, o Fibroblast Growth Factor (FGF)8, o Plateled-Derived Growth Factor (PDGF)4. e o Epidermal Growth Factor (EGF)17 estariam diretamente envolvidos na formação do queloide. Constatou-se, também, que ha um aumento da produção da Interleukin (IL-6), Interferon-beta (INF-â) e Tumor Necrosis Factor-alfa (TNF-1) e uma deficiência do Interferon-alfa (IFN-á) nos fibroblastos de queloide em relação aqueles de pele com cicatrização normal1Contudo, apesar de todas essas pesquisas, ainda não foi possível elucidar de forma mais concreta a fisiopatogenia do queloide.De fato, apenas se conhecem fatores de risco para o desenvolvimento do queloide. Destacam-se a tensão nas margens de feridas fechadas por primeira intenção, cicatrizes dispostas contra as linhas de menor tensão da pele, suturas em regiões de pele mais espessa ou em áreas onde ha maior concentração de melanina, suturas com espaços mortos ou hematomas sob a mesma, ou feridas que evoluíram com infecção ou cicatrização por segunda intenção”. Nesse sentido, os tipos mais frequentes de lesões cutâneas iniciais deflagradoras do queloide são o ferimento acidental (50%), intervenção operatória prévia (22,9%), referência a infecção em ferida (13,4%), sequela de queimadura (11%) e outros fatores não identificáveis (2,4%)°.Quadro clinicoO queloide caracteriza-se por estender0-se lateralmente para os tecidos adjacentes, em relação ao ponto de origem. Essa lesão pode ter crescimento continuo ou intermitente, com ausência de regressão significativa, e com tendência a recidiva apos a ressecção. Apresenta uma fase de atividade, exibindo sinais e sintomas, e uma fase de inatividade ou estável, sem a presença dos mesmos. Na fase de atividade, além de um objetivo e gradativo crescimento, os sintomas mais frequentes são o prurido (74%), a dor (19,1%), presença de infecção (1,5%) e a evolução para ulceração (0,6%)°. Cabe salientar também a importância da perturbação pessoal em termos de estética (56,8%) (Figura 1).Downloads
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