Relato de experiência 2

Authors

  • Letícia de Almeida Spina Fisioterapeuta, aluna do curso de Pós Graduação do Ibrape (Instituo Brasileiro de Pesquisa e Ensino) em Dermato-Funcional.
  • Maria do Livramento Saraiva Lucovéis Fisioterapeuta pós-graduada em fisioterapia cardio-pulmonar pela Santa Casa de Misericórida de São Paulo e graduanda em Enfermagem pela Uniban (Universidade Bandeirantes de São Paulo).

Abstract

O uso do Laser de Baixa Intensidade no Tratamento de Úlceras Diabéticas

IntroduçãoO diabetes mellitus é um importante e crescente problema de saúde pública para todos os países, independente do seu grau de desenvolvimento. Pelo fato do diabetes estar associado a maiores taxas de hospitalização, maior necessidade de cuidados médicos, maior incidência de doenças cardiovasculares e cerebrovasculares, cegueira, insuficiência renal e amputações não-traumáticas de membros inferiores, pode-se prever o ônus que isso representará para os sistemas de saúde pública dos países latino-americanos, a maioria ainda com grandes dificuldades no controle de doenças infecciosas1.Mais de 120 milhões de pessoas no mundo possuem diabetes mellitus, e muitos desses indivíduos apresentam úlcera no pé, o que pode levar a uma amputação do membro inferior, acarretando prejuízos para o paciente e para o sistema de saúde2.É caracterizado como “pé diabético”, segundo o Consenso Internacional de Pé Diabético, como um estado clínico onde há lesões cutâneas e de planos profundos relacionados a alterações neuropáticas, vasculares e infecciosas do paciente com diabetes mellitus2.Cerca de 15% dos diabéticos desenvolvem ulceração no pé em alguma fase da evolução da doença, configurando uma das complicações crônicas com grande potencial incapacitante e de alta morbimortalidade. Em amputados diabéticos, cerca de 87% apresentam ulceração no pé como fator causal e uma mortalidade duas vezes maior quando existe úlcera infectada. O problema de amputação em diabéticos torna-se mais relevante devido à probabilidade de ocorrência de uma segunda amputação nos cinco anos seguintes após a primeira cirurgia, aumentando gradativamente o impacto na vida familiar e na qualidade de vida deste paciente3.É de fundamental importância a adequada avaliação do “pé de risco” e prevenção destas ulcerações, visto que o índice de amputações, entre outras complicações, é elevado, porém, quando já instalada a ulceração, é de igual importância seu adequado tratamento, que envolve uma abordagem multidisciplinar, já que a causa da úlcera plantar é multifatorial, sendo considerados fatores predisponentes a neuropatia periférica, a vasculopatia periférica e as alterações biomecânicas do pé1.MétodosTrata-se de um relato de caso com consentimento escrito de um paciente do sexo masculino, 68 anos, assistido em seu domicílio no município de São Paulo. Os dados evolutivos foram obtidos por meio de registros fotográficos digitais e mensuração das áreas das feridas com decalque.Descrição do casoPaciente negro, do sexo masculino, com história de diabetes mellitus há 20 anos, sem controle diário dos níveis glicêmicos e uso de hipoglicemiante oral. Apresenta antecedente de hipertensão arterial sistêmica, também sem controle dos níveis pressóricos, e uso oral de hipotensor. Em março de 2002 foi submetido à amputação de ante pé direito, devido à evolução de uma úlcera diabética para gangrena bolhosa. Em fevereiro de 2004, foi submetido a uma nova amputação, agora de mediopé (amputação de Chopart) do mesmo membro, também por grangrena. Após cicatrização da ferida cirúrgica foi encaminhado para um centro de reabilitação, onde foi confeccionada prótese para o MID. O uso inadequado da prótese causou três novas ulcerações: lesão 1 (fig. 1): região tibial anterior (2 cm abaixo da articulação do joelho), classificada como grau I de Wagner13 e com área inicial de 7x5,5 cm; lesão 2 (fig. 2): região lateral de calcâneo, classificada como grau I de Wagner e com área inicial de 3,4x2,5 cm; lesão 3 (fig. 2): região posterior da perna classificada como grau II de Wagner com área inicial de 12,3x8,5 cm. As lesões apresentavam grande quantidade de exsudato seropurulento, com odor moderado, além de bordas hiperemiadas e friáveis. Na lesão 1, o tecido desvitalizado recobria todo o seu leito, e na lesão 3, apresentava-se abundante, além de uma exposição do tendão calcâneo. Referido pelo paciente quadro álgico grau 7 (escala analógica visual), promovendo dificuldades na mobilização do membro, na sua locomoção e no repouso, o que diminuiu sua qualidade de vida.As condutas tomadas foram controle dos níveis glicêmicos e pressóricos diariamente e adequação da medicação por via oral, através de atendimento médico em uma UBS (Unidade Básica de Saúde). Para higiene das lesões foi utilizada solução fisológica morna em jato, no leito das feridas e nas áreas peri-lesionais utilizado sabonete líquido (glicerinado). Após a higiene das lesões, o laser foi aplicado com emissor tipo contíno (35mW) de arsênieto de gálio e alumínio (AsGaLnP), com comprimento de onda de 660nm classe I tipo B (NBR IEC 60601-1), potência de saída 20mW, feixe colimado e área de emissão de 0,035cm2, calibrado previamente pelo fabricante. A dosimetria utilizada foi de 4J/cm2, calculada automaticamente pelo equipamento conforme o tamanho do feixe de emissão. A técnica de aplicação foi pontual, a caneta aplicadora foi envolvida em película de poliuretano, e os disparos foram realizados nas bordas e no leito das lesões por contato. Para cobertura foram utilizados gases de rayon (acetinada), levemente umedecidas em solução fisiológica e precedido enfaixamento não compressivo com atadura de crepe. Os materiais utilizados foram disponibilizados pela UBS local para o paciente, exceto o equipamento de laser.ResultadosNa 15º semana de tratamento os sinais flogísticos estavam presentes apenas na lesão 1 (fig. 2a). E um predomínio de tecido de granulação foi observado nas lesões 2 e 3 no mesmo período. A lesão 2 evoluiu para completa epitelização na 16º semana (fig 3) sendo suspensas as aplicações de laser neste local. O paciente foi orientado sobre os cuidados locais, como traumas e hidratação da pele, a fim de evitar nova ulceração no tecido recém-formado.Ao final do tratamento, o que ocorreu na 26º semana, pois o paciente necessitou voltar a sua cidade no estado da Bahia, a lesão 1 (fig. 4a) estava coberta por tecido de granulação, com bordas sem sinais flogísticos, diminuição da área (3,6x4cm) e exsudato, além de diminuição da dor, avaliadas pelo paciente em grau 2, durante a limpeza apenas. A lesão 3 (fig. 4b) também apresentou leito coberto por tecido de granulação, diminuição da área (5,3x4cm), exsudato e dor.DiscussãoAs úlceras diabéticas apresentam freqüentemente comprometimento vascular4,5, como angiopatia do “pé diabético”, representada principalmente pelas lesões estenosantes da aterosclerose, reduzindo o fluxo sanguíneo. Sabendo que um bom fornecimento de sangue para a ferida e suprimento adequado de oxigênio são partes essenciais do processo de cicatrização6, a utilização da laserterapia foi viável neste estudo, já que proporciona melhor vascularização do tecido irradiado e promoção de neoangiogênese, favorecendo assim melhor suprimento sanguíneo e, conseqüentemente, de oxigênio a esses tecidos7,8.Na fase de reconstrução do processo de reparação tecidual, os fibroblastos sintetizam actina e tornam-se contrateis, produzindo contração da cicatriz e aproximando mais as bordas da ferida9. Com estímulo, a proliferação celular de fibroblastos, por meio da aplicação do laser de baixa intensidade10,11, um aumento na velocidade de contração da ferida e uma melhor resistência à tensão da cicatriz é obtida quando empregado este recurso12,13.A manutenção do meio úmido foi realizada com os recursos disponíveis como a gaze de rayon levemente umedecida em solução fisiológica, desta forma, prevenindo a desidratação do tecido e morte celular, favorecendo maior decomposição do tecido desvitalizado e fibrina6.A melhora do quadro álgico com uso do laser tem sido uma de suas maiores indicações clínicas, esse resultado foi obtido neste estudo a partir da 4º aplicação. Sua ação é resultado do impedimento da formação do potencial de ação no nervo periférico afetando a condução do estímulo nervoso14, e pelo aumento nos níveis de ß-endorfina dosadas no líquor15,16.A incidência de diabetes mellitus do tipo II é crescente, como conseqüência das mudanças de estilo de vida da sociedade moderna. Por ser uma doença metabólica crônica, resultante da interação entre fatores genéticos e ambientais, fica clara a necessidade de se adquirir um estilo de vida mais saudável, priorizando uma alimentação balanceada, exercício físico regular e manutenção do peso corporal ideal, de acordo com o momento biológico de cada um5.ConclusãoO uso do laser no tratamento de úlceras diabéticas apresentou bons resultados neste estudo, evoluindo as lesões para uma diminuição das áreas e sinais flogísticos, menor quantidade de exsudato e controle da dor, favorecendo uma melhora na qualidade de vida deste paciente.


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Published

2006-09-01

How to Cite

1.
Spina L de A, Lucovéis M do LS. Relato de experiência 2. ESTIMA [Internet]. 2006 Sep. 1 [cited 2024 Dec. 22];4(3). Available from: https://www.revistaestima.com.br/estima/article/view/190

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