Dificuldades na Assistência às Pessoas com Fístulas Digestivas: Estudo com Enfermeiros não estomaterapeutas
Abstract
ResumoEste estudo, de natureza quantitativa descritiva, teve por objetivo identificar as dificuldades dos enfermeiros não estomaterapeutas no cuidado de pessoas com fístulas digestivas. Os dados foram coletados por meio de aplicação de um questionário, após consentimento dos enfermeiros, direcionado às dificuldades encontradas durante a assistência ao paciente com fístula digestiva. Os dados foram apresentados por meio de tabelas e gráficos. As maiores dificuldades encontradas foram referentes à colocação de bolsa coletora, cuidados com a pele perifístula e escolha de produtos adequados; quando havia dúvidas pertinentes ao cuidado da fístula digestiva, os profissionais mais procurados eram a supervisora/chefia de enfermagem ou os enfermeiros do mesmo plantão. É aconselhável ter enfermeiros especializados em estomaterapia na instituição para promover qualificação e acompanhamento, garantindo assistência adequada ao paciente com fístula digestiva.Palavras-chave: Assistência de enfermagem. Sistema digestório. Fístula.AbstractThis descriptive quantitative study aims to identify the difficulties that nurses not specialized in enterostomal therapy encounter in caring for patients with gastrointestinal fístulas. The data were collected after informed consent from the nurses by means of a questionnaire focused on the difficulties encountered in caring for a patient with gastrointestinal fístula. The data is presented in the form of tables and graphs. The main difficulties reported by the nurses were the fitting of the collection pouch, maintenance of the perifístula skin and choice of the right care product. In the event of questions and concerns about the care of gastrointestinal fístulas, the nurses looked for advice from the supervisor/chief nurse or other nurses working on the same shift. It is advisable to have certified enterostomal therapy nurses on staff to ensure and provide quality care to patients with gastrointestinal fístula.Keywords: Nursing care. Digestive system. Fístula.IntroduçãoAs fístulas são comunicações anômalas entre duas superfícies epitelizadas1. Podem ocorrer entre dois órgãos, entre um órgão e outra estrutura tissular ou o meio exterior2. Geralmente constituem complicações de doenças, acidentes ou mesmo iatrogenias.Existem diversos fatores que predispõem ou favorecem o seu desenvolvimento e manutenção, tais como a idade avançada, estado nutricional, doenças de base ou associadas (diabetes mellitus, doenças cardio-circulatórias, hipóxia, cirrose, doenças de pele e outras)3. A localização e classificação das fístulas podem ser feitas de acordo com características anatômicas, fisiológicas e etiológicas. Além das características e volume do líquido perdido, exames subsidiários como o raio-X contrastado, tomografia computadorizada, podem ser utilizados para o diagnóstico. A fistulografia é útil para definir o trajeto, além de determinar se existe obstrução distal deste ou presença de coleções como os abscessos4.A maioria das fístulas digestivas aparece no período pós-operatório e podem ser decorrentes de defeitos da cicatrização, erros na confecção das anastomoses por alterações na linha de sutura como tensão excessiva, má vascularização, técnica inadequada ou lesões iatrogênicas5. Em cerca de 85% dos casos ocorre como conseqüência de intervenções cirúrgicas realizadas em situações de urgência. Aparecem mais freqüentemente entre o quinto e o décimo dia de pós-operatório (PO), e podem constituir uma complicação grave, com altos índices de mortalidade6. Esta taxa pode ser diminuída devido ao suporte nutricional, antibioticoterapia, cuidados com a ferida e técnicas cirúrgicas aprimoradas7.O suporte nutricional nas pessoas com fístulas digestivas busca permitir a restauração das proteínas tissulares, a melhora das defesas imunitárias, a cicatrização dos tecidos lesados, o ganho de peso, o aumento da força muscular e a melhora do estado geral. A nutrição parenteral total representa progresso indiscutível na cicatrização das fístulas digestivas, inclusive pela diminuição do débito fistuloso, e no preparo dos doentes para intervenção cirúrgica, quando indicada8.A assistência de enfermagem com qualidade é fundamental no restabelecimento desses pacientes, sendo importante à avaliação das características da fístula (origem, localização, abertura, número de trajetos, tipo e tempo de existência); do efluente (composição do pH, consistência, odor e volume); da pele (integridade e doenças associadas). Com esta avaliação, o plano de ação individualizado pode ser traçado e programado, devendo ser flexível para o alcance dos objetivos9.A ocorrência de fístula prolonga o tempo de recuperação e implica em procedimentos que não faziam parte do plano inicial de tratamento. O impacto psicológico desse evento no paciente e família pode ser devastador, se não trabalhado adequadamente10. O cuidado da pessoa com fístula digestiva é complexo e exige habilidades e conhecimentos específicos dos profissionais de enfermagem. Diante disso, este estudo teve por objetivo conhecer as dificuldades que os enfermeiros não estomaterapeutas encontram na assistência a pessoas com fístulas digestivas.MétodosPesquisa descritiva realizada junto aos enfermeiros generalistas que referiam experiência na assistência de pessoas com fístulas digestivas nas unidades de pronto socorro, unidade de terapia intensiva, clínica cirúrgica e clínica médica de um hospital geral público, localizado no Estado de São Paulo.O Projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas da Universidade de Taubaté e posteriormente pelo Comitê de Ética da Instituição.Após a autorização da instituição, as pesquisadoras iniciaram a coleta de dados na primeira quinzena de dezembro de 2006, com duração de quinze dias.Os enfermeiros foram procurados pelas pesquisadoras em suas unidades no horário de trabalho e indagados sobre a sua experiência com fístula. Em caso afirmativo, eram orientados quanto à pesquisa, assinavam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e recebiam o questionário, contendo nove questões, sendo três fechadas (sexo, se possuía especialização e em que unidade(s) havia atuado) e seis abertas (idade, tempo de formado, principais dificuldades na assistência a pessoa com fístula digestiva, a que fator relacionava a(s) dificuldade(s) apontadas, a qual profissional recorria em caso de dúvidas, se considerava-se apto a assistir a pessoa com fístula digestiva). Em seguida eram informados sobre o tempo máximo de uma hora para o preenchimento do mesmo. Após esse período as pesquisadoras retornavam as unidades para o recolhimento dos questionários preenchidos.Os dados obtidos foram apresentados por meio de gráficos e tabelas.ResultadosDos 19 enfermeiros participantes, 21% (4/ 19) eram do sexo masculino e 79% (15/19) do sexo feminino, com idades que variavam entre 25 e 57 anos, com média de idade de 32 anos.Em relação à especialização em outras áreas que não a estomaterapia, 79% (15/19) não a possuíam e o tempo de formação profissional em 74% (14/19) estava dentro da faixa de 0-5 anos.Com relação às dificuldades referidas n=23, porque quatro enfermeiros deram duas respostas, foram a colocação da bolsa coletora (30,4% - 7/ 23), cuidados com a pele perifístula (26,1% - 6/ 23) e escolha de produtos adequados (17,4% - 4/ 23 ) para o cuidado de fístulas digestivas.Os itens com maior evidência relacionados às dificuldades durante a assistência ao paciente com fístula digestiva foram o uso indevido da bolsa coletora (26,2% - 5/19), a falta de conhecimento técnico-científico(21% - 4/19) e a falta de esclarecimento do paciente (21% - 4/19) ( Tabela 1).Tabela 1 – Distribuição dos enfermeiros segundo os itens relacionados às dificuldades durante a assistência aos pacientes com fístula, São Paulo, 2006
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