Estudo de Caso

Authors

  • Eline Lima Borges Enfermeira Estomaterapeuta (TiSOBEST). Professora Adjunta da Escola de Enfermagem da UFMG. Mestre pela EEUFMG. Doutora pela EERP-USP. Endereço: Campus Saúde da UFMG. Escola de Enfermagem. Av. Alfredo Balena, 190, Santa Efigênia. Belo Horizonte-MG.
  • Carolina Araújo Novais Carolina Araújo Novais. Aluna do Curso de Graduação em Enfermagem da UFMG. Bolsista do Projeto de Extensão “Atendimento ao Paciente Portador de Ferida Crônica da EEUFMG e Hospital das Clínicas da UFMG”.

DOI:

https://doi.org/10.5327/re.v8i2.271

Abstract

Tratamento de Úlcera Venosa com Solução de Polihexametileno Biguanida e Betaína e Cobertura de Espuma com Prata
Treatment of Venous Ulcers With Polyhexamethylene Biguanide and Betaine Solution Combined With Silver Foam Dressing
Tratamiento de Úlcera Venosa con Solución de Polihexametileno Biguanida y Betaína y Cubierta por Espuma con Plata

ResumoA presença de uma lesão cutânea crônica interfere na vida da pessoa podendo comprometer os aspectos físico, emocional, social ou psicológico. No decorrer da evolução da lesão podem ocorrer complicações que atrasam o processo de cicatrização, sendo a mais freqüente a infecção. Para minimizar esse agravo é importante que o profissional adote condutas para criar condições desfavoráveis à colonização de microrganismos. Constata-se que, nos últimos anos, surgiram vários produtos para tratamento tópico que visam à redução de microrganismos e conseqüente cura das lesões. Dessa forma, torna-se necessário que os profissionais avaliem o desempenho desses novos produtos no tratamento de lesões na prática clínica. O objetivo foi analisar a evolução das úlceras venosas tratadas topicamente com solução de limpeza com polihexametileno biguanida e betaína e cobertura de espuma com prata. Trata-se de um estudo de caso desenvolvido com dois pacientes e três úlceras venosas, cuja evolução da área das lesões foi acompanhada durante três meses. Os resultados foram relevantes para a prática clínica, pois comprovou que as lesões apresentaram uma redução da área lesada de 35% a 66%, além da observação da diminuição do volume do exsudato e odor desagradável. Houve relato de desaparecimento da dor por parte dos pacientes. Apesar de o estudo constatar resultados favoráveis ao uso da solução de polihexametileno biguanida e betaína e cobertura de espuma com prata no tratamento de úlcera venosa, ele também apresentou algumas limitações como o restrito número de lesões submetidas ao tratamento, o que inviabilizou generalizar os seus resultados.Descritores: Úlcera venosa. Prata. Biofilmes.AbstractThe presence of a chronic skin lesion affects a person’s life, and may compromise the physical, emotional, social or psychological well-being of the individual. As the lesion progresses, complications that delay the healing process may occur, with infection being the most common. In order to minimize the risk of infection, it is important that health professionals take measures to prevent the growth of microorganisms. In recent years, several topical antimicrobial products have been designed to reduce the number of microorganisms, thus contributing to wound healing. Therefore, it is necessary to evaluate the performance of these new products in the treatment of wounds in clinical practice. The aim of this study was to evaluate the progress of venous ulcers treated topically with a cleansing solution containing polyhexamethylene biguanide (polyhexanide) and betaine, and covered with silver foam dressing. This is a case study conducted with two patients, comprising a sample of three venous ulcers, whose progression was monitored for three months. The results were relevant to clinical practice, because they showed a reduction in the lesion surface area ranging from 35% to 66%, as well as a decrease in the volume of exudate and odor. The patients reported cessation of pain. Although we obtained favorable results with the use of a solution of polyhexamethylene biguanide and betaine combined with silver foam dressing in the treatment of venous ulcers, the study had some limitations, such as the small number of lesions treated, which limits the possibility to generalize the results.Descriptors: Venous Ulcer. Silver. Biofilms.ResumenLa presencia de una lesión crónica de la piel puede comprometer el aspecto físico, emocional, social o psicológico de la persona. Durante la evolución de la lesión se pueden producir complicaciones que retrasan el proceso de cicatrización, pudiendo ser la infección más frecuente. Para minimizar este tipo de gravedad es importante que los profesionales de la salud adopten conductas para crear condiciones desfavorables para la colonización de microorganismos. Se constata que en los últimos años surgieron varios productos para el tratamiento tópico reduciendo el crecimiento de los microorganismos y con esto la curación de las lesiones. Lo objetivo fue analizar la evolución de las úlceras venosas tratadas tópicamente con solución de limpieza con polihexametileno biguanida y betaína y el revestimiento con espuma de plata. Se trata de un estudio de caso desarrollado con dos pacientes con tres úlceras venosas, cuya evolución de las áreas lesionadas fue supervisada durante tres meses. Las lesiones presentaron una reducción de la zona dañada del 35% al 66%, además de la observación de la disminución del volumen de exudado y del olor desagradable. Fueron reportados por los pacientes la desaparición de dolor. Aunque el estudio destaca los resultados favorables al uso de solución de polihexametileno biguanida y betaína y el revestimiento de espuma de plata en el tratamiento de úlcera venosa, también presentó algunas limitaciones como el número limitado de lesiones sometidas a un tratamiento que hizo imposible generalizar los resultados.Palabras-clave: Úlcera venosa. Plata. Biofilmes.IntroduçãoA presença de uma lesão cutânea crônica interfere na vida da pessoa que a apresenta. Pode comprometer os aspectos físico, emocional, social ou psicológico. No decorrer da evolução da lesão podem ocorrer complicações que atrasam o processo de cicatrização, sendo a mais freqüente a infecção.No tratamento tópico das lesões é importante o profissional adotar condutas para criar condições favoráveis aos mecanismos de cura da lesão e desfavoráveis à colonização de microrganismos, consequentemente, minimizar o risco de infecção1. A colonização de uma lesão é definida como o crescimento e a multiplicação de um microrganismo em um hospedeiro sem desencadear manifestação clínica2. Nas lesões crônicas, quando o processo se torna crítico e apresenta alterações clínicas, está frequentemente associado à ação de Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus, Staphylococcus coagulase-negativos, Escherichia coli, Klebsiella ssp., Enterococcus fecalis e Streptococcus sp. hemolíticos. As lesões, também, podem apresentar infecção e quando isto ocorre o microrganismo invade os tecidos profundos e neles se multiplica, ocasionando danos tissulares e orgânicos que se manifestam em fenômenos clínicos, por exemplo, hipertermia, hiperemia, aumento do volume de exsudato e presença de odor desagradável3.Para reduzir o número de microrganismos na lesão e minimizar o risco de colonização crítica e infecção, recomenda-se uma limpeza criteriosa que auxilia na retirada de restos orgânicos e inorgânicos presentes no leito da lesão, elimina o tecido necrótico solto e diminui o número de microrganismos antes da aplicação da cobertura4-5. Essa etapa do tratamento é o primeiro ato terapêutico que se realiza para facilitar a avaliação do tipo e aspecto do tecido existente na lesão e definição das suas margens.Uma premente preocupação dos profissionais, advinda do aumento da resistência dos microrganismos aos antibióticos, é a adoção de estratégias para controlar o crescimento bacteriano e evitar o aparecimento de infecções que retardam a cicatrização4. Para controlar o crescimento microbiano, os profissionais da prática clínica utilizam produtos específicos para a limpeza da lesão. Um exemplo é a solução que contém surfactante que, além de reduzir o número de microrganismos, não interfere na cicatrização. Uma solução cujo uso tem sido difundido na prática clínica é composta de um surfactante catiônico, propil-betaína, que propicia a remoção efetiva de detritos, dissolvendo o componente lipídico, e por uma substância que exerce ação conservadora, a polihexanida biguanida, garantindo a estabilidade da solução por oito semanas após abertura do recipiente, evitando assim, a contaminação bacteriana. Apresenta composição que permite que a solução seja atóxica, hipo-alergênica, não desencadeia irritações ou queimaduras de contato e não é absorvida6. Essa solução é capaz de promover o rompimento da estrutura do biofilme removendo-o do leito das lesões. Biofilme é constituído por comunidades de microrganismos que crescem englobados em uma matriz de polissacarídeos aderidos a uma superfície6.A solução de limpeza, por possuir uma parte hidrofílica e outra hidrofóbica, liga-se à superfície do biofilme rompendo-o. O uso dessa solução é indicado em lesões criticamente colonizadas ou infectadas, porque contêm tensoativos que interagem com as cargas negativas dos fosfolípides da membrana bacteriana alterando a sua organização estrutural e a distribuição das cargas iônicas, levando à ruptura da parede do microrganismo e, consequentemente, à redução do seu número. Essa solução é indicada, principalmente, para a eliminação de bactérias Gram+, Gram- e fungos4,6.O tratamento tópico da lesão demanda o uso de cobertura além da limpeza. Atualmente está comprovado que ao se ocluir uma lesão forma-se uma barreira física entre o leito lesado e o meio externo, garantindo alguns dos princípios ideais para uma rápida cicatrização como umidade e Estudo Cdleín Cicaoso temperatura. Surge assim, o vocábulo cobertura, conceituado como todo material utilizado sobre as lesões com objetivos de ocluir e comprimir, além de favorecer a cicatrização. As coberturas utilizadas para o tratamento de lesões são classificadas em passivas, interativas e bioativas, sendo que as interativas garantem condições adequadas de temperatura, umidade e oxigenação necessárias à cicatrização7.A escolha da cobertura para o tratamento tópico das lesões deve considerar a capacidade que esta apresenta de prevenir infecção. O controle desse evento é uma questão importante, principalmente, quando se trata da contínua expansão de microrganismos resistentes a antibióticos como, por exemplo, os Streptococcus â hemolítico e Pseudomonas spp. Além destes, um microrganismo resistente que está em ascensão é o Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA)8. No mercado nacional há várias coberturas indicadas para lesões criticamente colonizadas ou infectadas. Uma delas é a cobertura que contém prata, indicada para remover ou reduzir a carga microbiana de lesões abertas e em áreas cutâneas queimadas, ou agir como uma barreira contra a contaminação de microrganismos resistentes como o MRSA8.Nas observações dos estudos in vitro, a prata elementar (Ag°) parece não ter ação antimicrobiana, contudo o seu cátion Ag+ é altamente reativo e eficaz em baixas concentrações8. Sabe-se que esse íon interage com os grupos sulfidril, amino, fosfato e carboxil de aminoácidos que compõem as proteínas da membrana da bactéria levando à desnaturação desse componente do microrganismo1. É provável que a presença de uma grande quantidade de prata com liberação contínua de seu cátion Ag+ promova maior taxa de morte bacteriana, fornecendo assim um largo espectro de ação8.No início do século XXI, o uso de coberturas com prata tornou-se freqüente devido à sua ação antimicrobiana e à sua baixa toxicidade para as células humanas. Hoje, uma seleção de coberturas de espumas, hidrocolóides e outros materiais impregnados com prata está disponível comercialmente, inclusive no Brasil8.As coberturas com prata tornaram-se alternativa aos anti-sépticos tradicionais e antibióticos tópicos no tratamento de lesões crônicas criticamente colonizadas ou infectadas, pois apresentam um amplo espectro de ação9. Um exemplo é a espuma com prata iônica associada ao alginato de cálcio que apresenta atividade antimicrobiana e previne a lesão de contaminações externas. Essa cobertura é recomendada para o tratamento de lesões de espessura parcial a total, por exemplo, úlceras por pressão, úlceras venosas e lesões decorrentes de diabetes mellitus.O aumento do número de produtos para tratamento tópico, que visam à redução de microrganismos e conseqüente cura das lesões, acarreta a necessidade dos profissionais avaliarem o desempenho desses novos produtos para o tratamento de lesões na prática clínica.ObjetivoAnalisar a evolução de três úlceras venosas tratadas topicamente com a solução de limpeza polihexametileno biguanida e betaína e cobertura de espuma com prata.MétodoTrata-se de um estudo de caso com abordagem avaliativa. O estudo de caso tem origem na pesquisa médica e na pesquisa psicológica, com a análise de modo detalhado de um caso individual que explica a dinâmica e a patologia de uma determinada doença. Com este procedimento, supõe-se que se pode adquirir conhecimento do fenômeno estudado a partir da exploração intensa de um único caso10-11.Apesar do estudo de caso não necessitar da elaboração a priori de hipóteses, sua complexidade aumenta à medida que o investigador utiliza um referencial teórico norteador no aprofundamento do assunto em questão. Os passos ou operacionalização utilizados nesta metodologia não estão bem definidos, ao contrário das outras modalidades de pesquisa, pois a maioria dos estudos de caso surge na tentativa de elucidar um problema prático específico12.Uma das maiores vantagens apresentada pelo estudo de caso é a profundidade alcançada por este tipo de pesquisa, possibilitando investigar um número limitado de indivíduos, instituições ou grupos. Por outro lado, a mais séria desvantagem deste método deve-se ao fato de que seus dados e relações estão delimitados na particularidade de um sujeito e, por sua vez, não produzem proposições para testar hipóteses12.A pesquisa foi realizada no ambulatório de um hospital universitário durante um período de cinco meses. A amostra foi constituída de três úlceras venosas de dois pacientes submetidos ao tratamento com cobertura de espuma com prata após limpeza das lesões com solução de polihexametileno biguanida e betaína. A variável analisada foi a área lesada, considerando o aumento ou redução da mesma no decorrer do período em avaliação, em porcentagem.A evolução da área lesada foi acompanhada pela sua mensuração, obtendo-se as medidas por meio do desenho do contorno da lesão em acetato esterilizado. Desenhou-se o contorno da lesão com caneta para retroprojetor e tomaram-se como referências os pontos mais extensos da altura e da largura. Traçaram-se duas linhas de forma a obterse um ângulo de 90º 13, anotaram-se os valores em centímetros e com eles calculou-se a área da lesão, multiplicando-se um valor pelo outro. Nos casos em que havia mais de uma lesão localizada na mesma região, procedeu-se à soma das respectivas áreas lesadas. As medidas da lesão foram realizadas antes do tratamento, nos 7º e 15º dias e ao final de cada mês, até completar três meses de acompanhamento. As medidas foram realizadas pelo mesmo profissional e foram acompanhadas pelo registro fotográfico, conforme protocolo do serviço.Os pacientes foram submetidos à troca de curativo no ambulatório e o responsável pelo procedimento foi o enfermeiro. A troca do curativo, no primeiro paciente foi realizada duas vezes na semana, durante o primeiro mês de tratamento e a seguir, semanalmente. No segundo paciente, foram mantidas duas trocas por semana, durante os três meses consecutivos. A diferença de padrão de troca de curativo ocorreu devido à redução do volume de exsudato das lesões com a evolução da cicatrização.A cada troca de curativo procedeu-se à limpeza da perna que continha a lesão com água corrente morna e sabonete líquido e as lesões foram irrigadas exaustivamente com solução de surfactante e polihexametileno biguanida e betaína. A seguir, manteve-se gaze embebida com essa solução sobre a lesão por 15 minutos. Após esse tempo, fez-se a limpeza das margens da lesão com gaze úmida com a solução. Aplicou-se creme hidratante na pele íntegra e as lesões foram ocluídas com cobertura de espuma com prata. Posteriormente, aplicou-se terapia compressiva inelástica – bota de Unna – na perna lesada para facilitar o retorno venoso e reduzir a hipertensão venosa.Os dados foram analisados e apresentados de forma qualitativa e discutidos amparados no referencial teórico sobre o tema.Este estudo de caso faz parte do projeto de pesquisa intitulado “Feridas de Membros Inferiores: Protocolo de Tratamento” aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Minas Gerais sob o parecer nº ETIC094/00. Os dados foram obtidos com o consentimento dos pacientes e com respaldo no protocolo da instituição. Destaca-se que a pesquisa respeitou os termos da Resolução 196, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde. Os pacientes que concordaram em participar desta fase da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).ResultadosOs pacientes tratados topicamente com solução de polihexanida biguanida-betaína e cobertura de espuma com prata apresentavam úlceras de etiologia venosa com colonização crítica. Inicialmente são apresentados os dados referentes ao paciente S.C.P. e, a seguir, o paciente B.X.A., acompanhado das evoluções das respectivas lesões.Constatou-se que o procedimento de limpeza das lesões com a solução de polihexanida biguanida-betaína, principalmente após manutenção da gaze embebida com a mesma solução sobre a Estudo Cdleín Cicaoso lesão por 15 minutos, desencadeou o desprendimento espontâneo do tecido necrótico de aspecto membranoso. Foi possível a retirada da necrose com o auxílio da cureta, sem causar danos ao tecido de granulação (Figura 1). Pode-se inferir que essa ação auxiliou o processo de cicatrização, uma vez que acelerou o desbridamento da lesão. 

O primeiro caso analisado, referente à S.C.P., mulher de 50 anos com úlceras venosas há 5 anos, decorrentes de insuficiência venosa. Apresentava hipertensão arterial sistêmica controlada com antihipertensivos e índice de massa corporal classificado como sobrepeso (29,48 Kg/m²). Possuía histórico de uso de coberturas interativas na Unidade Básica de Saúde, mas sem associação com a terapia compressiva.No início do tratamento, a paciente apresentava duas lesões na região do maléolo medial da perna direita, cuja soma das duas áreas lesadas correspondia a 38,3 cm² (Figura 2) e uma lesão na região do maléolo lateral do mesmo membro, com área de 85,4 cm2. As lesões apresentavam sinais clínicos de colonização crítica. A descrição da evolução das lesões está apresentada no Quadro 1. 

No 7º dia de tratamento e após duas trocas de curativo, constatou-se um ligeiro aumento (19,2%) na área total das lesões da região do maléolo medial que passou a 45,6 cm². Esse aumento, provavelmente, resultou do desbridamento autolítico desencadeado pelo processo de limpeza e uso da cobertura, tornando possível a visualização das bordas da lesão e a real área lesada. No 1º mês de tratamento, após a 8ª troca de curativo, a soma da área das lesões era de 33,5 cm², correspondendo à redução de 12,4% em relação à medida inicial. No 2º mês de tratamento e após 12 trocas de curativo comprovou-se uma redução da área de 37,2%. Durante o tratamento houve redução progressiva da área lesada e aumento da epitelização, pois no 3º mês existia apenas uma lesão na região do maléolo medial com área total de 16,0 cm², correspondendo a uma redução de 58,2%, quando comparada com a área do início do tratamento (Figura 3).A região do maléolo lateral apresentava uma lesão com área de 85,4 cm² no início do tratamento (Figura 4); e 75,0 cm² no 7º dia, após duas trocas de curativo, correspondendo a uma redução da área de 12,2%.No 2º mês de tratamento, após doze trocas de curativo, a área lesada atingiu 34,3 cm², registrando-se redução de 59,8% na área lesada em relação à medida inicial (pré-tratamento). A área lesada foi reduzindo gradativamente e subdividindo-se devido à formação de ilhas de epitelização. Ao completar o 3º mês de tratamento, a paciente apresentava três lesões na região do maléolo lateral, cuja soma era de 28,9 cm², ao compará-la com a medida do início do tratamento (Figura 5).O segundo caso analisado refere-se a B.X.A., homem de 79 anos com insuficiência venosa e úlcera venosa de longa data, com recidiva há sete anos. É diabético controlado com hipoglicemiante oral e cardiopata em uso de digitálico. Apresentava índice de massa corporal dentro dos parâmetros de normalidade (22,1 Kg/m²); e histórico de tratamento tópico com diversas coberturas interativas e uso de terapia compressiva inelástica (bota de Unna).No início do tratamento apresentava uma lesão com sinais clínico de colonização crítica, na região do maléolo medial da perna esquerda. A descrição da evolução da área lesada está apresentada no Quadro 2. 

A lesão localizada na região do maléolo medial apresentava uma área equivalente a 45,5 cm² no início do tratamento (Figura 6); após sete dias de tratamento e duas trocas de curativo apresentou uma redução de 12,3% na área lesada perfazendo 39,9 cm². No 15º dia de tratamento, após quatro trocas de curativo, constatou-se um pequeno aumento na área lesada que passou para 40,3 cm².Durante três meses de tratamento, a lesão demandou 24 trocas de curativos e apresentou redução gradativa da área alcançando uma taxa de 34,8%, atingindo 29,7 cm² (Figura 7).No período de três meses, quando as lesões foram submetidas à limpeza com a solução de polihexametileno biguanida e betaína e tratadas com cobertura de espuma com prata, foi possível constatar a redução da área lesada e o aparecimento de ilhas epiteliais. Observou-se ainda a diminuição do volume do exsudato e odor desagradável, provavelmente decorrente do controle da carga bacteriana. No decorrer do tratamento, os pacientes relataram desaparecimento da queixa álgica e não apresentaram reação alérgica ou queixa de queimação na pele ao redor da lesão.DiscussãoO objetivo do tratamento de uma lesão é a cicatrização sem complicações, com a restauração das funções e prevenção de complicações. O tratamento tópico deve visar ao desenvolvimento de cicatrização funcional e estética do paciente, facilitando a cura fisiológica. Os meios terapêuticos devem ser aplicados por uma equipe multidisciplinar que, por sua vez, utilizar-se-á de procedimentos e materiais com base científica. Para otimizar a cicatrização de lesões com colonização crítica ou infecção é importante implementar condutas capazes de reduzir a carga microbiana. Nesses casos, podem-se usar solução com surfactante, para o procedimento de limpeza, e coberturas com prata para a oclusão.No Brasil, estão disponíveis diversas coberturas com prata, inclusive a espuma, capazes de manter a umidade fisiológica no leito lesado por meio da absorção do excesso de exsudato. O número de estudos clínicos publicados referentes ao tempo de cicatrização com o uso da espuma com prata no tratamento de lesões, inclusive úlcera venosa, ainda é pequeno quando comparado com estudos sobre outros tipos de coberturas comumente utilizadas no tratamento de lesões cutâneas crônicas.Em estudo de revisão integrativa, publicado em 2009, e realizado com o objetivo de avaliar as evidências do uso de coberturas com prata na terapia tópica de queimaduras de espessura parcial, dos 17 estudos analisados pelos autores, nenhum se referia ao uso da espuma com prata. Os autores concluíram que coberturas impregnadas com prata reduzem a incidência de complicações infecciosas, dor e apresentam custo-efetividade para o tratamento de queimaduras de espessura parcial quando comparadas com tratamento convencional14.Com o objetivo de examinar a relação custo-eficácia do uso da cobertura espuma com prata no tratamento de úlceras venosas gravemente colonizadas ou de difícil cicatrização, realizou-se no Reino Unido um estudo comparando essa cobertura com as coberturas de hidrofibra com prata, carvão com prata e cobertura com iodo. Foi realizada uma análise econômica estruturada para avaliar o custo de redução relativa do tamanho da ferida em quatro semanas de tratamento. Ao final do estudo concluiu-se que os tratamentos com espuma e carvão, ambos com prata, foram os mais eficazes. A redução relativa média do tamanho da ferida foi 50,2% no grupo espuma, 44,6% com o uso do carvão, 36,0% com a 36 - Estudo Cdleín Cicaoso cobertura com iodo e 23,9% com hidrofibra com prata. Os resultados obtidos sugerem que o tratamento com espuma com prata tem melhor custo-eficácia15.A redução da área lesada obtida no presente estudo de caso variou de 35% a 66% em três meses de tratamento. Esse resultado também foi obtido pelos pesquisadores do estudo intitulado “Dressing changes every 3 days: fiction or reality?”, com objetivo de examinar se a utilização de um curativo de espuma alginato de prata com troca a cada três dias é econômica e se ele oferece vantagens para o paciente. Para tal, fez-se seguimento de uma mulher de 61 anos de idade com uma úlcera de perna venosa dolorosa. Embora não houvesse sinais evidentes de infecção na lesão, a dor poderia caracterizar uma colonização crítica. A lesão foi submetida ao procedimento de limpeza com solução de polihexanida-betaína (surfactante) e aplicada cobertura de espuma de alginato e prata, em combinação com a terapia de compressão para melhorar o retorno de sangue venoso. No início, foi realizada troca de curativo a cada dois dias para inspeção freqüente da lesão. No entanto, com a melhora da lesão, a cobertura permaneceu durante três dias. Ao final do segundo mês de tratamento, houve redução da superfície da lesão que epitelizou completamente ao término do terceiro mês16.Além da redução da área lesada, outros resultados como melhoria da dor e odor também foram corroborados no estudo de Münter (2006). Esse pesquisador realizou um estudo comparativo sobre a utilização de coberturas de espuma com prata e outras comumente utilizadas na prática clínica, por exemplo, espumas sem prata, alginatos, hidrocolóides, coberturas com outros antimicrobianos e coberturas de não espuma com liberação de prata. A amostra foi constituída de 619 pacientes com úlceras de diversas etiologias e o tratamento compreendeu quatro semanas. Os resultados obtidos mostraram que a lesão obteve redução de 50% em sua área com o uso de cobertura de espuma com liberação de prata comparativamente a 34% de redução com as outras coberturas. Obtiveram-se ainda melhores resultados com o uso de cobertura de espuma com liberação de prata quanto à redução do esfacelo, redução mais rápida do nível de exsudato e evolução positiva da ferida17.Certamente, a melhoria da lesão e o progresso para a cura são aspectos importantes, mas um fator relevante é a melhoria na qualidade de vida dos pacientes, permitindo que os mesmos retornem à sociedade sem se sentirem excluídos, segregados ou discriminados6.ConclusãoOs resultados encontrados foram relevantes para a prática clínica, pois comprovou que as lesões submetidas à limpeza com solução de surfactante e tratadas com cobertura de espuma com prata além da terapia compressiva apresentaram redução das áreas lesadas de 35% a 66%, em três meses de tratamento. Também se observou a diminuição do volume do exsudato e odor desagradável. Houve relato de desaparecimento da dor por parte dos pacientes.Apesar de o estudo constatar resultados favoráveis ao uso da solução de surfactante e cobertura de espuma com prata no tratamento de úlcera venosa, ele também apresentou algumas limitações como o restrito número de lesões submetidas ao tratamento e o desenho metodológico o que inviabilizou generalizar os resultados. Sugere-se o desenvolvimento de outros estudos com cálculo amostral e desenhos controlados que permitirão a realização de cálculos estatísticos e a generalização dos resultados.

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Published

2010-06-01

How to Cite

1.
Borges EL, Novais CA. Estudo de Caso. ESTIMA [Internet]. 2010 Jun. 1 [cited 2024 Nov. 21];8(2). Available from: https://www.revistaestima.com.br/estima/article/view/271

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