Estudo clínico
Resumo
Hidrofibra com Prata e Hidrogel com Alginato na Cicatrização de Ferida em Paciente com Diabetes MellitusHydrofiber with Silver and Hydrogel with Alginato on the Wound Healing in Patients with Diabetes MellitusResumoTrata-se de um relato de experiência sobre o tratamento de uma lesão neuropática em uma pessoa com diabetes melitus, com o uso de Hidrofibra com prata por 5 dias e com Hidrogel com Alginato por 115 dias. Com 5 dias de tratamento, a cobertura com Hidrofibra com Prata auxiliou no debridamento autolítico da lesão e a absorção do exsudato. Com 115 dias de tratamento, o curativo de Hidrogel auxiliou na cicatrização da lesão. Com este trabalho foi possível acompanhar a cicatrização nesse tipo de lesão e relatar a experiência do uso dessas tecnologias.Palavras Chaves: Cuidados de enfermagem. Diabetes melitus. Pé diabético. Cicatrização de feridas.AbstractIntroduction: It is a report about the experience of a neuropathic lesion treatment in a person with diabetes melitus, using the hydrofiber with silver during 5 days and with hydrogel with alginate during 115 days. During 5 days of treatment the dressing with hydrofiber with silver helped to remove the lesion dead tissue by itself and the absorption of exsudate. During 115 days of treatment the wound dressing with hydrogel helped in the wound healing. It was possible, with this treatment, to folow the healing on this type of lesion and report the experience of these technologies.Key words:Nursing care. Diabetes melitus. Diabetic foot. Wound healing.IntroduçãoO aumento da proporção de idosos tem-se configurado um fenômeno global na população brasileira. O segmento que mais cresce é o de pessoas idosas. Entre 1991 e 2000, o número de habitantes com sessenta anos ou mais aumentou 2,5 vezes (35%) quando comparado com o restante da população do País (14%)1.O processo de envelhecimento populacional ocorrido nas sociedades ocidentais modernas traz várias repercussões para a sociedade, podendo se configurar em problema social. O cuidado com a população idosa representa um desafio para o sistema de saúde, uma vez que há maior ocorrência de doenças crônicas e incapacitantes nessa faixa etária quando comparada às outras2.Entende-se por doença crônica aquela que requer um constante acompanhamento médico e tratamento de controle. Ela pode ser minimizada ou persistir por toda vida do indivíduo, constantemente afetando-o na execução de suas rotinas diárias, seja pela necessidade de hospitalização, realização de exames, acompanhamento médico ou mesmo permanência no domicílio3.O diabetes é um estado hiperglicêmico crônico acompanhado de complicações agudas e crônicas que podem incluir dano, disfunção ou falência de órgão, especialmente de rins, nervos, coração e vasos sanguíneos. É uma doença comum e de incidência crescente na população adulta. Em 2025, alcançará a cifra de 5,4%, ou seja, 300 milhões de pessoas. No Brasil, hoje existem 5 milhões de pessoas com diabetes, sendo 7,6% da população com idade entre 30 e 69 aos. Vale ressaltar que 50% das pessoas desconhecem o diagnóstico e 24% sabidamente diabéticos não fazem tratamento. Apesar dos avanços no cuidado dos pacientes diabéticos, as internações ainda são frequentes, com custo alto para o sistema de saúde4.As complicações do diabetes mellitus encontram-se entre as primeiras causas de morte em vários países, e cerca de 20% de todos os diabéticos desenvolvem úlcera em membros inferiores em algum momento de sua vida. Estimase que 60 a 70% dos pacientes diabéticos tenham neuropatia periférica 15 a 20% tenham doenças vasculares periféricas e 15% a 20% tenham as duas. Na maior parte dos casosas duas. Na maior parte dos casos, o pé diabético, ou pé em risco, evolui para amputação dos membros inferiores. Sabe-se que no período de três anos após a amputação, a sobrevida é de 50%, no prazo de dez anos a mortalidade é de 39 a 68%, principalmente em razão da infecção hospitalar5.Segundo Hess5, os custos financeiro e emocional e as complicações potenciais associadas ao efeito dessa doença sobre os pés são de suma importância. Assim, evitar a perda do membro e de sua função é o objetivo da equipe multiprofissional que trata dos pacientes com úlcera no pé diabético. Para atingir esse objetivo, esses profissionais devem compreender a abrangência e a gravidade do diabetes e seus resultados fisiológicos.Diante do exposto, é necessário que o enfermeiro trabalhe junto ao paciente para alcançar a meta do autocuidado, de forma a conscientizá-lo acerca da doença e suas complicações. Esse trabalho deve ser realizado por meio de orientação sistematizada e individualizada. Durante as orientações, o profissional deve frisar muito a importância do controle da doença por meio de exames, de dietas e de medidas preventivas das complicações da doença, entre elas a ocorrência de ferimentos nos pés.Com essas ações, ocorre a diminuição de gastos com o tratamento, custo hospitalar, melhorando a auto-estima, a auto-imagem, a qualidade de vida da pessoa com diabetes mellitus, com ou sem ulceração no pé.ObjetivoRelataro tratamento instituído em uma ferida no pé de paciente com diabetes mellitus.MétodosPesquisa descritiva do tipo estudo de caso. O caso foi realizado em um Hospital localizado na cidade de São Paulo, no período de 5 de dezembro de 2006 a 10 de abril de 2007, com a autorização por escrito do responsável pelo paciente, precedida da explicação verbal sobre os objetivos e métodos do estudo, também foi solicitado autorização para o Diretor clínico do hospital onde foi realizada a pesquisa.Relato do caso: S.L, sexo masculino, 65 anos, admitido no Pronto Socorro no dia 3 de dezembro de 2006, diabético há 10 anos, usuário de insulina regular (5 unidades ao dia). Apresentava-se com 410mg/dl de Glicemia capilar, temperatura 38º C e abscesso no pé esquerdo. Depois de 4 horas da sua internação na clínica cirúrgica, foi submetido a uma drenagem de abscesso e realização de desbridamento cirúrgico e amputação do primeiro dedo.O controle glicêmico foi realizado a cada 2 horas, sendo avaliado pela nutricionista, que prescreveu suplemento alimentar, que é um aliado na dieta do diabético, pois contribui para melhor controle glicêmico e menos complicações. A suplementação nutricional oral de pacientes agudamente enfermos melhora o estado nutricional e reduz número de novas hospitalizações6,7,8.Foi colhido material para cultura da ferida, tendo como resultado Staphylococus aureus, sendo tratado sistemicamente com Imipenen.Terapia tópica: na avaliação feita por um membro da comissão de Curativo, em 5 de dezembro de 2006, foi observado que a lesão apresentava uma área extensa de esfacelo, com grande quantidade de exsudado de aspecto purulento, odor fétido e pele ao redor ressecado (Figura 1), sendo então, adotada terapia tópica com hidrofibra com prata a cada 48 horas. A limpeza da lesão foi feita com solução fisiológica morna, em jato, com seringa de 20 ml e agulha 40x12. A umectação do membro com creme a base de Ácido Graxos Essenciais, Ômega 6 e 3, Ácido Linoléico e Ácido Linolênico.Figura 1 - lesão neuropáti em pé esquerdo, primeiro dia de tratamento.
Outras medidas: as observações foram feitas antes do início da pesquisa e a cada troca do curativo. A mensuração da extensão da ferida foi realizada antes do início da pesquisa e durante o tratamento, sempre em centímetro, considerando-se maior comprimento e a maior largura. O registro fotográfico foi realizado por uma máquina digital, antes de ser iniciada a pesquisa e no decorrer do tratamento da lesão.Resultados e Discussão Após essa limpeza cirúrgica foi realizada a retirada parcial de esfacelos remanescentes a cada troca de curativo. Por 10 dias foi mantida terapia tópica com a hidrofibra com prata, somente sendo substituída quando houve o controle do exsudato. A partir do dia 15 de dezembro de 2006 (Figura 2), o curativo passou a ser realizado com hidrogel a cada 24 horas e troca de curativo secundário sempre que necessário, sendo essa a conduta mantida até a conclusão do caso. O paciente ficou internado na clínica cirúrgica por 20 dias, após a alta passou a ser acompanhado diariamente no ambulatório.O tempo de acompanhamento da evolução da lesão perdurou pelo tempo de 126 dias, quando apresentava 97,8% da cicatrizada.Adotou-se a hidrofibra com prata por ter ação hidrofílica, o que garante a absorção e retenção do exsudato. Suas fibras secas absorvem em seu interior o exsudato e as bactérias, dilatandose de forma vertical, diminuindo a evasão lateral de líquido, diminuindo o risco de maceração ao redor da ferida e propiciando a formação de gel coeso, o qual possibilita o contato direto entre a cobertura e a lesão, eliminando o espaço morto9.Borges et al10, relataram a experiência do uso de Hidrofibra com Prata em um paciente com hidradenite supurativa, em ferida infectada na região glúteo, e chegaram à conclusão que a Hidrofibra com prata foi eficaz no tratamento de ferida com infecção, promovendo assim a cicatrização da lesão.Salomé & Arbage11, utilizaram a Hidrofibra com prata em um paciente com Síndrome de Fournier, com grande quantidade de exsudato, em região glúteo, concluíram que apesar da amostra estudada ser pequena, observou-se um excelente resposta do paciente ao tratamento, principalmente na retirada do tecido desvitalizado e na remoção do exsudato.A mudança pelo hidrogel se fez quando a lesão passou a apresentar exsudato fisiológico, diminuição do tecido de esfacelo e início de crescimento de tecido de granulação. Nessa data a mensuração da ferida foi de 23 cm de comprimento e 10 cm de largura, ou seja, 230 cm2. (Figura 2).Figura 2 - Lesão Neuropática em pé esquerdo, dez dias de tratamento
Avaliação continuada de uma ferida é uma parte fundamental do processo de tratamento das lesões, pois o diagnóstico preciso do tipo e estágio da lesão vai permitir a correta tomada de decisão sobre as medidas a serem implementadas e os recursos que serão utilizados12.Ao realizar o curativo da ferida, deve-se evitar o traumatismo do tecido de granulação, pois este retarda o processo de cicatrização. Assim sendo, optou-se pelo hidrogel com alginato.O hidrogel com alginato é um gel transparente, hidroativo e amorfo, cria um ambiente de hidratação na recuperação da ferida que ajuda autólise enquanto o componente de alginato aumenta a sua consistência, facilitando a sua aplicação. Favorece a angiogênese, promove desbridamento autolítico e mantém o meio úmido. Também pode ser usado nas diferentes fases da cicatrização13.No dia 5 de janeiro de 2007 (Figura 3), a lesão demonstrou um aumento do tecido de granulação no centro e nas margens da ferida e pouco esfacelo no leito da lesão. A mensuração da ferida foi de 20 cm de comprimento e 6 cm de largura, correspondendo a uma área de 120 cm2, havendo diminuição em 52,1% da área inicial. Manteve-se a mesma conduta do curativo anterior.Figura 3 - Lesão Neuropática em pé esquerdo, trinta e um dias de tratamento.
O tecido de granulação apresenta uma coloração vermelha, principalmente devido à formação de novos capilares. Além disso, tem uma aparência granular e ligeiramente irregular. O estado do tecido de granulação é um bom indicador do processo de cicatrização do tecido. As características da granulação saudável são: coloração vermelha viva, brilhante e que não sangra facilmente14.No dia 24 de janeiro de 2007 (Figura 4), a lesão apresentou um aumento do tecido de granulação no centro e nas margens da ferida, diminuição do esfacelo nas margens de ferida. Manteve-se a mesma conduta do curativo anterior. As medidas foram 18 cm de comprimento e 4 cm de largura (72 cm2), havendo diminuição de 68% da área inicial.Figura 4 - Lesão Neuropática em pé esquerdo, cinqüenta dias de tratamento.
No dia 10 de abril de 2007 (Figura 5), a lesão apresentou com suas margens mais aproximadas, permanecendo apenas uma área de cerca de 5 cm2 para epitelização total, sendo portanto cicatrizada 97,8% da área da ferida. A partir disso, o paciente optou dar continuidade ao tratamento em sua casa, tendo em vista que a ferida estava praticamente cicatrizada.Figura 5 - Lesão Neuropática em pé esquerdo, cento vinte e seis dias de tratamento.
ConclusãoA Hidrofibra com Prata e Hidrogel com Alginato foram coberturas que auxiliaram na cicatrização da úlcera em pé de paciente com diabetes mellitus.ConsideraçõesEmbora o estudo seja restrito por se tratar de caso, o tratamento prescrito corretamente auxiliou no alívio da dor e controle do exsudato, promovendo assim a cicatrização da ferida. Em função dos achados, alterou-se a rotina institucional, sendo preconizado o produto, possibilitando beneficiar outros pacientes. Além disso, tivemos a oportunidade de nos aprofundar cientificamente nesse tipo de lesão e nas tecnologias adotadas.Downloads
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