Artigo Original 2
Resumo
Percepção de pacientes com estomia sobremitos e medos relacionados a esta condição
ResumoO estudo teve como objetivo identificar, enumerar e caracterizar os mitos e medos apresentados por pacientes com estoma. Apesquisa baseou-se em um estudo descritivo, usando o método indutivo. A amostra constou de pacientes de ambos os sexos, semlimite de idade e os resultados evidenciaram que a maioria dos pacientes referiu medo ou mito frente à sua condição. Dentre estes,a percepção de uma vida futura inativa, solitária, que pode despertar nojo nas pessoas, discriminação e desprezo. Entre os medos,destaca-se o medo de morrer, ser maltratado por conhecidos, parentes e amigos e o medo de sofrimento. Os problemas relacionadosà estomia foram a ausência de vida ativa e medo de lidar com o estoma. Observa-se que muitos medos foram superados pelaconfiança em Deus, pela fé e apoio da família.Palavras-chave: Estomia. Medo. Características culturais.AbstractThe aim of this study was to identify, enumerate and characterize myths ad fears of ostomy patients. The research was basedon a descriptive study, using the inductive method. The sample consisted of patients of both sexes; there was no age limit forinclusion. The results revealed that the majority of the patients reported fear or myth related to their condition, such as lonelinessand an inactive life expectancy, which may give rise to feelings of disgust, discrimination and scorn on the part of others.Foremost among the fears were the fear of dying, fear of being mistreated by acquaintances, relatives and friends, and fear ofsuffering. The problems related to the ostomy were lack of an active life, and fear of dealing with the ostomy. It was observedthat many fears were overcome by confidence in God, faith and family support.Key words: Ostomy. Fear. Cultural characteristicsIntroduçãoO paciente com estoma sofre em sua vidapessoal e em sociedade, pois o estoma modificasua aparência anatômica, alterando sua autoimagem.O estoma altera os padrões de saúde ebeleza e também o desempenho do paciente comoindivíduo rodutivo e ativo, dentro de umasociedade competitiva. No convívio profissionalcom pacientes com estoma, observa-se sentimentos como ansiedade quanto à vida futura; medo dedependência da família; receio de intervir na rotinados componentes familiares, expor-se a um grupode amigos; insegurança no manuseio e higiene doestoma; sensação de que a bolsa coletora possavazar em lugares e momentos impróprios; alteraçãoda imagem corporal e conceito de utilidade,levando-os a comportamentos semelhantes deexclusão ou limitação no convívio social, entreoutros, sendo que estes posicionamentos levam muitos pacientes à depressão1,2,3,4,5,.As pessoas com estoma deparam-se commudanças significativas na auto-imagem,preocupação com as alterações apresentadas comoperda de integridade da pele e região periestoma,odores fétidos, ruídos desagradáveis, mudança docotidiano com relação à vida sexual e perda daauto-estima, o que leva o paciente a confrontar-secom fases diferentes de adaptação. Taispreocupações causam várias perturbações deajustamento, levando a alterações decomportamento, os sintomas depressivos atingemuma morbidade elevada, revelando-se de sumaimportância uma c o m p a n h a m e n t omultidisciplinar ajustado aosdoentes oncológicos, para quetodos em conjunto estejam emalerta para sinais e sintomas.Após a fase de diagnóstico,muitos doentes apresentamchoque, descrença, ansiedade,depressão e culpa. Nos doentesoncológicos, acrescenta-se umaameaça à vida. Nos pacientescom colostomia, podemocorrer sentimentos devergonha, repugnância,depressão, afastamento social,medo do odor e, por vezes,ressentimento em relação aocirurgião6,7,8.Na avaliação de doentescom doenças oncológicascomo a colostomia, foiobservada alta prevalência de perturbaçõespsiquiátricas. Daí a importância do apoiopsicológico, integrado numa equipe multidisciplinarpara os doentes que irão submeter-se à cirurgiageradora de estomia. Há vários tipos de estomias:jejunostomia, gastrostomia, ileostomia, colostomia,traqueostomia, urostomia. Todos os tipos levamo paciente a alterações físicas, o que resulta emmudança do cotidiano, da rotina anterior, associadoà mutilação emocional, familiar e individual,trazendo sofrimento e sensações até entãodesconhecidas4,9,10,11.O ser humano tem necessidades básicas aserem supridas, sendo as mesmas de vitalimportância para sua sobrevivência, e o maissignificativo, ter e poder manter a qualidade devida, é uma garantia para atingir de maneira positivaseu papel na família e sociedade, além davalorização pessoal. Quando as necessidadesbásicas são atendidas, o homem atinge aindependência e maturidade comportamental epassa a participar e contribuir positivamente paraa comunidade em que vive. Diante dessasconsiderações, passou-se a questionar: Que tiposde mitos e medos apresentam os pacientes de umambulatório do hospital público da cidade deGuarulhos submetidos a cirurgias geradoras deestoma? Qual sua percepçãosobre sua nova condição devida? Quais os fatoresimaginários ou reais quecontribuem de maneirapositiva ou negativa narecuperação do paciente comestoma, diante de sua novacondição e perspectiva devida? Os questionamentosque direcionaram este estudosão importantes, pois cadasituação nova gera dúvidas eé preciso, portanto, conhecer,identificar, especificar,enumerar quais são estesfatores para que de umamaneira holística se conheçacada indivíduo, para tratá-locomo único7, 12, 13, 14.O medo e ansiedadetêm suficientes elementos emcomum para serem tratados da mesma forma,no que diz respeito às suas conseqüênciasmotivacionais; alguns autores, contudo,estabeleceram distinções entre eles e as distinçõesmais críticas relacionam-se com a imediação ou aidentificação das condições do estímulo. Quandouma reação emocional semelhante ao medo éprovocada por uma situação em que não seidentificam de pronto os elementos de estímuloatemorizante, a reação temida não está presentena situação imediata do estímulo. É difícil relacionara distinção entre o medo e ansiedade com aintensidade da resposta. Entretanto, a ansiedadepode ser conceituada como medo com um objetofuturo de referência, medo por não saber o que ocorrerá após a confecção do estoma.Desenvolvendo conceitos sobre o estoma (mitos)que colaborarão de maneira sombria à recuperaçãofísica e ao desenvolvimento da saúde mental. Oconhecimento desta vivência dos pacientesestomizados permitirá uma reflexão por parte doscuidadores (profissionais de enfermagem efamiliares), possibilitando a adoção decomportamentos (ações e atitudes) mais específicase adequadas às expectativas dos pacientes2, 7.Esse estudo tem como objetivos caracterizaro perfil sociodemográfico e clínico de pacientescom estoma e identificar quais os medos e mitosque incomodam e limitam essa clientela.MétodosA pesquisa foi realizada em um ambulatóriode estomizados em hospital público da cidade deGuarulhos. A população estudada foi compostapor pacientes de ambos os sexos, sem limite deidade, no período de abril a maio de 2005. O tipode pesquisa utilizada foi a descritiva, por atendermelhor aos objetivos desejados. O método utilizadofoi do tipo indutivo. A coleta de dados foi pormeio da técnica de observação direta através deentrevista em formulário específico para esse fim.As entrevistas foram realizadas após a assinaturado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,e esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Éticaem Pesquisa da UNITAU.Resultados e DiscussãoNa população estudada, composta de 45pacientes, observa-se que houve predomínio dosexo masculino, 28 (62,2%) em relação ao sexofeminino, 17 (37,8%). A idade variou entre 15 e 90anos, sendo 20 (44,4%) pacientes entre 45-60 anose 10 (22,2%) estão entre 60-75 anos. Na maioriadas pessoas com estomas, a faixa etáriapredominante foi entre 45 a 60 (Figura 1). Estimaseque 30% da população acima de 60 anos e 60%da população acima de 80 anos possa estaracometida pela enfermidade. A incidência dadoença aumenta 5% (cinco por cento) ao redor daquinta década de vida15,16. A causa principal quegerou os estomas foi devido a doenças neoplásicasmalignas com 27 (60%); oito (18%) devido atraumas; seis (13%) com Doença de Cröhn; três(7%) com a doença de Volvo e 1 (2%) comdiverticulite. Com relação a neoplasia os resultadossão semelhantes a outros estudos brasileiros17,18.Figura 1 – Distribuição dos pacientes estomizados, segundo a faixa etária. Na Figura 2, pode-se verificar que acolostomia foi predominante, ou seja, 43 (96%),assim como em outros estudos17,18, em relação àileostomia (2%) e gastrostomia (2%). O tempo deestomizados variou entre menos de 1 ano e maisde 10 anos, sendo que 21 (46,7%) pacientes tinhamestoma há menos de 1 ano. Figura 2 – Distribuição dos pacientes, segundo o tipode estoma. Sobre os sentimentos destes pacientes emrelação a pessoas com estomas (Figura 3),predominou a falta de conhecimento sobre asituação em 38 (85%). Esse dado caracteriza aimportância de levar a toda a populaçãoinformações por meio de projetos de divulgaçãosobre os centros de atendimentos a estomizados,divulgação sobre o que vem a ser um indivíduocom estoma. O restante, 7 (15%) manifestaram sentimentos de medo, pena (“dó”), normalidade esem preconceitos. Já na análise dos resultadosreferentes aos sentimentos apresentados frente asua nova condição de vida, agora comoestomizados, são verificados os mitos e medos queas pessoas com estomas referiram, imaginários oureais. Os comentários efetuados demonstramsumariamente os sentimentos, expectativas, mitose medos referidos pelos pacientes entrevistados,frente à nova realidade.Houve respostas bem controversas, mas amaioria mostrou nitidamente o medo diante danova situação, de não saber lidar com o estoma 18(16,2%); o medo de morrer, com 16 (14,4%)também é um dos problemas mais apresentados.Em seguida vêm outros problemas comodificuldade de trabalhar e limitações, receio dealterar rotinas, exalar odores, que ao todo somam44 (39,6%). Morrer (14,4%); em seguida, vieram apreocupação com as limitações e as dificuldadesde voltar a trabalhar; o medo de exalar odores emrecintos impróprios; vergonha; preocupação coma aposentadoria, perda de esperança e depressão.A pesquisa mostra também que após o estoma, 12(23,1%) pacientes disseram imaginar que tudo serianormal, como antes; 11 (21,2%) imaginaram queseria difícil conviver com tal condição; 10 (19,2%) não chegaram a imaginar como seria a vida delesapós o estoma; seis (11,5%) referiram que teriammuito sofrimento após o estoma (Tabela1).Figura 3 – Distribuição segundo o sentimento dos
pacientes manifestados, referente a outras pessoas com
estoma.
Figura 4 - Distribuição dos pacientes segundo a situação
sexual após a presença do estoma.
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