Artigo Original

Autores

  • Sílvia Angélica Jorge Enfermeiras, pós-graduadas em Estomaterapia pela FCM-Unicamp.
  • Catarina Pauletti Guimarães Enfermeiras, pós-graduadas em Estomaterapia pela FCM-Unicamp.
  • Denise A Demattei Henríquez Enfermeiras, pós-graduadas em Estomaterapia pela FCM-Unicamp.
  • Sônia Regina Pérez Evangelista Dantas Enfermeira (TiSOBEST), Coordenadora do Curso de Especialização em Estomaterapia, FCM – Unicamp.

Resumo

Avaliação do Nível de Ansiedade de Pacientes com Úlceras Venosas


ResumoA úlcera venosa apresenta significativa morbidade e altera vários aspectos da vida das pessoas acometidas, podendo refletir nos níveis de ansiedade. Objetivo: identificar traço e estado de ansiedade nos pacientes com úlcera venosa em tratamento ambulatorial e correlacionar o nível de ansiedade-traço e estado com a idade e tempo de existência da ferida. Métodos: estudo transversal, descritivo e analítico (CEP 561/2008). Para coleta de dados foram utilizados dois instrumentos: o questionário para caracterização do paciente com úlcera venosa e o Inventário de Ansiedade Traço - Estado (IDATE). Resultados: foram avaliados 40 pacientes e a maioria (78%) relatou que a úlcera interferia em suas atividades sociais e de lazer. Todos os pacientes apresentaram algum nível de ansiedade. O nível de ansiedade-estado foi elevado em todas as faixas etárias e, quando comparado ao nível de ansiedadetraço, estes se mantiveram elevados, exceto na faixa etária de 51 a 60 anos, onde há predomínio do nível de ansiedade moderado. Conclusão: este estudo evidenciou que a ansiedade está presente em diferentes níveis nos pacientes com úlcera venosa. A ansiedadeestado foi elevada em todas as faixas etárias. Os níveis de ansiedade-traço e ansiedade-estado foram moderados nos pacientes com úlceras de 5 a 10 anos, contrastando com o nível de ansiedade elevado dos pacientes com maior tempo de úlcera.Descritores: Úlcera Venosa. Ansiedade. Cicatrização de Feridas.AbstractVenous ulcer has a significant morbidity and can interfere with many aspects of the life of persons with the condition, reflecting on anxiety levels. Objective: To identify trait and state anxiety in patients with venous ulcer at an outpatient care clinic and correlate trait and state anxiety levels with patient’s age and wound duration. Method: This was a transversal, descriptive and analytical study (CEP 561/2008). Two instruments were used to collect data: a questionnaire for the characterization of patients with venous ulcers and the State-Trait Anxiety Inventory (STAI). Results: Forty patients were evaluated in this study. Seventy-eight percent of the patients reported that the ulcer interfered with social and leisure activities. All patients experienced some level of anxiety. The level of state anxiety was high in all age groups and was also high when compared with the level of trait anxiety, except in the age group of 51 to 60 years where there is a predominance of moderate levels of anxiety. Conclusion: This study showed that anxiety is present at different levels in patients with venous ulcers. State-anxiety levels were high in all age groups. The levels of trait anxiety and state anxiety were moderate in patients who had ulcer for 5 to 10 years, differently from the high level of anxiety in patients who had ulcers for longer.Descriptors: Varicose Ulcer. Anxiety. Wound Healing.IntroduçãoO risco de desenvolver doenças crônicas degenerativas, dentre elas a insuficiência venosa crônica, está associado às alterações do estilo de vida e ao aumento da expectativa de vida¹.A insuficiência venosa é uma anormalidade do sistema venoso, causado por uma incompetência do sistema valvular, associado ou não à obstrução do fluxo venoso, afetando o sistema venoso superficial, profundo ou ambos2,3. As principais causas de úlceras venosas são a incompetência das válvulas das veias do sistema venoso superficial, perfurante e profundo, trombose de veias profundas, fistulas artério-venosas e falha da bomba muscular da panturrilha2,3,4.A insuficiência venosa crônica apresenta significativa morbidade e altera vários aspectos da vida das pessoas acometidas, principalmente sua capacidade produtiva, gerando piora da qualidade de vida devido a dor, desconforto e alterações da autoimagem, o que restringe suas atividades de vida diária e de lazer, afeta a produtividade no trabalho e pode levar à aposentadoria por invalidez, ocasionando problemas sócioeconômicos1,3,5. Estes fatores podem alterar os níveis de ansiedade destes pacientes.A ansiedade constitui um fenômeno de personalidade altamente representativo, devido à sua complexidade e à variedade de elementos que contém, sendo estes componentes, de natureza neurofisiológica, emotiva, motivacional e comportamental. Manifesta-se num padrão de ativação fisiológica, desordenada e escassamente funcional e num estado de ânimo desagradável para o sujeito. A ansiedade funciona como um impulso ou motivo determinante da ação do comportamento6. A ansiedade constitui um fenômeno de personalidade altamente representativo, devido à sua complexidade e à variedade de elementos que contém, sendo estes componentes, de natureza neurofisiológica, emotiva, motivacional e comportamental. Manifesta-se num padrão de ativação fisiológica, desordenada e escassamente funcional e num estado de ânimo desagradável para o sujeito. A ansiedade funciona como um impulso ou motivo determinante da ação do comportamento6.Pessoas com ansiedade criam um clima de tensão, insegurança e hostilidade, em relação aos demais; passam por uma série de mudanças psicológicas e de comportamento, decorrentes de um perigo físico ou psicológico experimentado. A reação da ansiedade é proporcional à magnitude do perigo real que a evoca, isto é, quanto maior o perigo externo, mais claramente a ameaça é percebida e mais intensa resulta a reação de ansiedade7,8.A Ansiedade-Traço (A-T) refere-se às diferenças individuais relativamente estáveis, na tendência de reagir a situações percebidas como ameaçadoras. O traço de ansiedade tem características que são disposições que permanecem latentes até que uma situação as ative, e resíduos de experiências passadas predisponham o indivíduo7.A Ansiedade-Estado (A-E) é considerada como um estado emocional transitório ou condição do organismo humano, que é caracterizado por sentimentos desagradáveis de tensão e apreensão conscientemente percebidos, que variam de intensidade segundo as formas de reação aos estímulos7.Fracassos pessoais, frustrações diante de expectativas não atendidas, comprometimento das próprias capacidades, situações que geram insegurança psicológica, perturbações graves dos processos emocionais, são condições que conduzem à interação de A-T e A-E7,8.O IDATE é um instrumento para avaliação do nível de ansiedade e neste estudo será utilizado para a compreensão das manifestações da ansiedade nos pacientes com úlcera venosa9.ObjetivosIdentificar traço e estado de ansiedade nos pacientes com úlcera venosa em tratamento ambulatorial e correlacionar o nível de ansiedade traço e estado com a idade e tempo de existência da ferida.MétodosEstudo não experimental, transversal, descritivo e analítico, contemplando pacientes com diagnóstico de úlceras venosas em tratamento ambulatorial, no interior do Estado de São Paulo.A coleta de dados foi realizada individualmente e uma única vez por uma das pesquisadoras, no momento da consulta e antes da realização de qualquer procedimento. O paciente foi informado sobre a pesquisa e, concordando em participar, assinou o Termo de Consentimento Livre Esclarecido e depois respondeu o Questionário para caracterização do paciente com úlcera venosa e o Inventário de Ansiedade Traço - Estado (IDATE). A pesquisa foi realizada após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM – UNICAMP), sob o número 561/2008.Os critérios de inclusão foram ter idade maior de 18 anos, concordar em participar da pesquisa e estar em tratamento ambulatorial de úlcera venosa.Os critérios de exclusão foram: deixar de responder um dos vinte itens de cada escala e indivíduos incapacitados de fornecer dados confiáveis.Instrumentos para coleta de dados1 – Questionário para caracterização do paciente com úlcera venosa: idade, sexo, etnia, crença religiosa, nível de escolaridade, situação marital, constituição familiar, situação empregatícia e renda familiar. Foi desenvolvido pelas pesquisadoras baseado na experiência profissional e, para que possa ser utilizado em outros estudos, foi submetido à avaliação e validação por quatro juízes, profissionais da área de saúde, que concordaram em participar após ter sido enviada carta apresentando o trabalho e seus objetivos.2 - Inventário de Ansiedade Traço - Estado (IDATE), constituído por duas escalas, sendo cada uma composta por 20 itens, contendo, cada um, quatro alternativas para resposta e requer que os sujeitos descrevam como geralmente se sentem, assinalando uma das alternativas: 1- quase nunca; 2- às vezes; 3- bastante; 4- quase sempre. A escala ansiedade-estado requer que o sujeito responda como se sente num determinado momento, assinalando uma das alternativas: 1-absolutamente não; 2- um pouco; 3- bastante e 4- muitíssimo. O total da escala varia de 20 a 80, sendo que os pontos mais altos indicam maior nível de ansiedade.A análise descritiva para caracterização da população foi realizada por meio de tabelas de frequência para variáveis categóricas e medidas de posição e dispersão para as contínuas. Para verificar a associação utilizou-se o cálculo da correlação de Pearson entre os escores de cada item das escalas de ansiedade-traço e ansiedade-estado, com o escore total de cada escala. Foram calculados a média aritmética, mediana e desvio padrão da idade e do tempo da ferida. O nível de significância adotado em todos os testes foi de 5%.ResultadosForam incluídos 40 pacientes com úlcera venosa, 27 (67,5%) do sexo feminino, 34 (85%) de etnia branca e mediana de idade de 70 anos (Mín 34 – Max. 91).Trinta e três (82,5%) eram de religião cristã, da denominação católica. Dezessete (42,5%) tinham nível de escolaridade inferior a 1 ano (alfabetizado), 16 (40%) de 1 a 7 anos (ensino fundamental) e 7 (17,5%) mais de 8 anos (ensino médio ou superior). Quanto à situação marital, 21 (52,5%) viviam em união, 12 (30%) eram viúvos e 7 (17,5%) eram solteiros ou separados. Trinta (75%) viviam com cônjuge, filhos ou parentes, 6 (15%) sozinhos e 4 (10%) em comunidades institucionais.Os dados obtidos em relação à situação empregatícia apontaram que 25 (62,5%) dos clientes apresentavam situação desocupada– remunerada (aposentado), 10 (25%) eram ativos– remunerados e 5 (12,5%) encontravam-se em situação desocupada–não remunerada. Quanto à renda familiar, 12 (30%) viviam com renda familiar abaixo de 1 salário mínimo, 11(27,5%) recebiam de 1 a 2 salários mínimos, 7 (17,5%) até 3 salários, 6 (15%) acima de 3 salários e 4 (10%) não tinham renda declarada.Em relação ao tempo de existência da úlcera, 12 (30%) eram inferior a 1 ano, 14 (35%) de 1 a 5 anos, 1 (2,5%) superior a 5 e inferior a 10 anos, 10 (25%) superior a 10 anos e 3 (7,5%) não tinham a informação. A mediana de existência da úlcera foi de 1,6 anos (Mín= 1 mês – Máx= 50,8 anos) e 78% relataram que a úlcera interferia em suas atividades sociais e de lazer.A Tabela 1 mostra a distribuição dos sujeitos de acordo com o nível de ansiedade-estado (EAE), ansiedade-traço (EAT) e gênero. Todos os pacientes apresentaram algum nível de ansiedade, sendo que 74,1% das mulheres e 100% dos homens apresentaram ansiedade-estado elevada, e 70,4% das mulheres e 84,6% dos homens apresentaram ansiedade-traço elevada.Nesta casuística, observa-se que o nível de ansiedade-estado foi elevado em todas as faixas etárias (Figura 1) e quando comparado ao nível de ansiedade-traço, estes se mantiveram elevados, exceto na faixa etária de 51 a 60 anos, onde há predomínio do nível de ansiedade moderado (Figura 2).Quando analisados os níveis de ansiedade relacionados ao tempo de existência da úlcera, observam-se níveis de ansiedade-traço e ansiedadeestado moderados nos pacientes com úlceras de 5 a 10 anos, contrastando com o nível de ansiedade elevado com os pacientes com maior tempo de úlcera (Figura 3 e 4).Em relação à idade e o nível de Ansiedade – Estado e Traço constata-se que há uma predominância do nível elevado em todas as faixas etárias, conforme Figura 5.

Tabela 1 - Distribuição dos pacientes segundo o nível de ansiedade estado e traço, de acordo com o sexo.

tabela01Figura 01

Figura 1 – Nível de ansiedade-estado (EAE) de acordo com a faixa etária.

 A Figura 6 mostra a distribuição do nível de ansiedade-traço e ansiedade-estado de acordo com o tempo de existência da ferida, em meses, em que se observa que há um maior número de pacientes com nível elevado de ansiedade e com ferida em tempo inferior a 40 meses e com idade que variam entre 60 a 90 anos, conforme a Figura 7.

Figura

Figura 2 – Nível de ansiedade-traço (EAT) de acordo com a faixa etária.

Figura 03

Figura 3 – Nível de ansiedade-estado (EAE) de acordo com o tempo de existência da úlcera.

Figura 04

Figura 4 – Nível de ansiedade-traço (EAT) de acordo com o tempo de existência da úlcera.

Grafico 05

Figura 5 – Nível de ansiedade – traço e estado de acordo com a idade

Grafico 06

Figura 6 – Nível de ansiedade – traço e estado de acordo com o tempo de existência de ferida

Graqfico 07

Figura 7 – Idade em relação ao tempo de ferida

DiscussãoNesta casuística, houve predominância de mulheres acima de 50 anos e etnia branca, caracterizando os dados existentes na literatura sobre a incidência de úlceras venosas3,4. Em estudo onde foi realizado o levantamento sóciodemográfico de pacientes com úlceras de perna, os autores também encontraram maior frequência em mulheres (65,3%), média de 64 anos e 90,3% das úlceras eram venosas10.Nesta amostra houve o predomínio de baixo nível de escolaridade, com renda familiar de 1 a 2 salários mínimos e a maioria em situação desocupada-remunerada. Em estudo de correlação dos efeitos da ansiedade sobre a pressão arterial em mulheres hipertensas, também foi encontrado 66,6% da população com primeiro grau incompleto e 89,6% com uma renda per capita inferior a 4 salários mínimos11. O nível de ansiedade em pessoas com condições sócioeconômicas menos privilegiadas pode estar relacionado com dificuldades de enfrentamento ativo, devido à precariedade dos recursos internos e externos e falta de perspectiva na escala social11,12.A maioria dos pacientes desta casuística tinha uma crença religiosa. A religião ou a espiritualidade pode ser fonte de alívio ou desconforto, de solução de problemas ou causa de estresse, dependendo de como a pessoa se relaciona com ela13.O tempo de existência da úlcera superior a 1 ano teve correlação com o nível de ansiedade elevado. Entretanto, foi observado que nos clientes com úlcera de 5 a 10 anos de existência, o nível de ansiedade diminuiu, o que talvez possa ser explicado pelo processo de habituação. Habituação refere-se ao desvanecimento da resposta ao longo de uma estimulação monótona, ou seja, é um exemplo de aprendizagem não associativa em que ocorre uma diminuição automática na intensidade de uma resposta a um estímulo repetitivo e capacita a criança ou o adulto a ignorar o que lhe é familiar e a focar a atenção na novidade14.A ansiedade-estado mostrou-se elevada em todas as faixas etárias, demonstrando que o ambiente e a expectativa dos procedimentos podem ser considerados fatores estressantes para essa população. Neste estudo, foi observado que 100% dos homens apresentaram ansiedade-estado elevada, caracterizando que situação pontual de estresse pode ser maior para o sexo masculino.Em um estudo sobre ansiedade – depressão e síndromes isquêmicas, comparando homens com mulheres, encontraram níveis de ansiedade traço e estado mais elevados em mulheres < 50 anos15.ConclusãoA ansiedade-estado foi elevada em todas as faixas etárias.A ansiedade-traço foi moderada na faixa de 51 a 65 anos.Os níveis de ansiedade-traço e ansiedadeestado foram moderados nos pacientes com úlceras de 5 a 10 anos, contrastando com o nível de ansiedade elevado com os pacientes com maior tempo de úlcera.

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Referências

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Publicado

2016-03-23

Como Citar

1.
Jorge SA, Guimarães CP, Henríquez DAD, Dantas SRPE. Artigo Original. ESTIMA [Internet]. 23º de março de 2016 [citado 22º de novembro de 2024];7(4). Disponível em: https://www.revistaestima.com.br/estima/article/view/53

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