Artigo Original 1

Autores

  • Elizabeth Mesquita Melo Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Ceará. Professora da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Enfermeira do Hospital Dr. Evandro Ayres de Moura e Hospital São José de Doenças Infecciosas. Endereço: Ageu Romero, 100, apto. 02, São Gerardo, CEP: 60325.110, Fortaleza-CE.
  • Vânia Sousa Fernandes Enfermeira graduada pela UNIFOR. Aluna do Curso de Especialização em Saúde da Família. Enfermeira do Hospital Geral de Fortaleza.

Resumo

Avaliação do Conhecimento do Enfermeiro acerca das Coberturas de Última Geração


ResumoO tratamento de feridas é um processo dinâmico, influenciado pela avaliação sistematizada do enfermeiro. Objetivou-se analisar o conhecimento do enfermeiro acerca das coberturas de última geração. Trata-se de estudo exploratório descritivo, com abordagem qualitativa, realizado em um hospital público, localizado em Fortaleza-Ceará, com 21 enfermeiros. Os dados foram coletados nos meses de março e abril de 2009, com um roteiro de entrevista semi-estruturado, organizados pela análise do conteúdo em três categorias. Os participantes associam ferida à perda da integridade da pele, enfocando fatores causais. Na avaliação da ferida, os enfermeiros destacam o tamanho e a profundidade, enfatizando que, na escolha do produto, é fundamental observar as características das lesões. Os produtos mais citados foram: alginato de cálcio, carvão ativado, ácido graxo essencial, hicrocolóide e hidrogel. Os profissionais estão cientes acerca da importância dos produtos para o paciente e para a ferida, ressaltando a cicatrização mais rápida da ferida, a promoção de conforto e do bem estar dos pacientes. As desvantagens associam-se principalmente ao custo elevado. Verificou-se a necessidade de treinamento em serviço, para que os profissionais conheçam, de forma mais aprofundada, tipos de curativos, indicações e técnicas de manipulação. Considera-se fundamental o conhecimento do enfermeiro acerca do processo de desenvolvimento da ferida e dos fatores envolvidos na cura, pois a avaliação criteriosa da ferida é imprescindível para a escolha da cobertura.Descritores: Conhecimento. Enfermagem. Curativos oclusivos.AbstractWound treatment is a dynamic process, which is influenced by the systematic assessment of nurses. The aim of this study was to assess the knowledge of nurses about new generation dressings. This qualitative, exploratory descriptive study was conducted with 21 nurses in a public hospital in Fortaleza, Ceará, Brazil. Data were collected between March and April 2009 using a semi-structured interview divided into three content analysis categories. The participants associated wound to loss of skin integrity and focused on causal factors. The nurses emphasized that the size and depth of the lesion are important factors in the assessment of wounds and that it is essential to observe the wound characteristics to select a dressing product. The most frequently mentioned products were calcium alginate, activated charcoal, essential fatty acid, hydrocolloid, and hydrogel. The nurses were aware of the importance of the correct choice of wound dressing products, especially to improve wound healing and promote patient comfort and well-being. Disadvantages were mainly associated with the high cost of some products. The results revealed the need for in-service training, so that nursing professionals can know more about the different types of dressings, and indications for their use and proper handling. The nurses’ knowledge of wound formation and the factors involved in the healing process is of fundamental importance, because the thorough assessment of the wound is essential for choosing the most appropriate
dressing.Descriptors: Knowledge. Nursing. Occlusive dressings.ResúmenEl tratamiento de heridas es un proceso dinámico, influenciado por la evaluación sistematizada del enfermero. El objetivo fue analizar el conocimiento del enfermero sobre los apósitos de última generación. Estudio exploratorio descriptivo, con abordaje cualitativo, realizado en un hospital público, localizado en Fortaleza-Ceará, con 21 enfermeros. Los datos fueron recolectados en marzo y abril de 2009, con una guía de entrevista semi-estructurada, organizados por el análisis del contenido en tres categorías. Los participantes asocian herida a la perdida de la integridad de la piel, enfocando factores causales. Al evaluar la herida, los enfermeros destacan el tamaño y la profundidad, recalcando que para elegir el producto es fundamental observar las características de las lesiones. Los productos más citados fueron: alginato de calcio, carbón activado, ácido graso esencial, hidrocoloide e hidrogel. Los profesionales son conscientes de la importancia de los productos para el paciente y para la herida, resaltando la cicatrización más rápida de la herida, y la promoción del bienestar de los pacientes. Las desventajas se asocian principalmente al costo elevado. Quedo evidente la necesidad de entrenamiento en campo, para que los profesionales conozcan, de forma más profunda, los tipos de apósitos, indicaciones y técnicas de manipulación. Es fundamental el conocimiento del enfermero sobre el proceso de desarrollo de la herida y los factores implicados en la curación, ya que es imprescindible una evaluación con criterio de la herida para la elección del apósito.Palabras clave: Conocimiento. Enfermería. Apósitos oclusivos.IntroduçãoO tratamento de feridas é um processo complexo e dinâmico, diretamente influenciado pela realização de avaliações sistematizadas, prescrições distintas de freqüência e tipo de produto ou cobertura necessários, de acordo com cada momento do processo cicatricial.A pele é o maior órgão do corpo, sendo composta de três camadas: derme, epiderme e hipoderme. Como qualquer outro órgão, está sujeita a agressões oriundas de fatores patológicos intrínsecos e extrínsecos que irão causar o desenvolvimento de alterações em sua constituição1. Tais alterações, quando ocasionam prejuízo nas funções da pele, são denominadas feridas. Vale destacar que a evolução destas está diretamente relacionada aos fatores intrínsecos do paciente, que obrigatoriamente deverão ser considerados no tratamento das lesões.No Brasil, as feridas acometem à população de forma geral, independentemente de sexo, idade ou etnia, determinando um alto índice de pessoas com alterações na integridade da pele e constituindo, assim, um sério problema de saúde pública1.O cuidado com a ferida faz parte das atribuições do enfermeiro. A abrangência dessa atuação vem crescendo nos últimos anos, devido ao maior conhecimento referente aos diferentes tipos de lesões, do processo de cicatrização dos tecidos e desenvolvimento científico e tecnológico da assistência de enfermagem a pacientes que apresentam lesões de pele2.A classificação das feridas é fundamental para o processo de avaliação e cuidado, pois vai permitir a correta tomada de decisão sobre as medidas a serem implementadas2. Essa classificação, embora bastante variável, pode ser feita pela causa (intencional ou traumática), pelo agente (incisa, contusa, perfurante, penetrante, abrasiva, etc), pelo conteúdo microbiano (limpa, potencialmente contaminada, contaminada ou infectada) ou pelo estágio da ferida3.A responsabilidade do enfermeiro, que se propõe a tratar lesões de pele, implica em conhecimento não apenas dos materiais de vanguarda disponíveis no mercado, mas, primeiramente, na compreensão sobre a fisiologia da cicatrização, que inclui as etapas básicas: fase inflamatória, fase proliferativa e fase reparadora 4,5. A fase inflamatória é caracterizada pelos sinais típicos do processo inflamatório, tais como: dor, rubor, calor, edema e, geralmente, perda da função local, sendo iniciada imediatamente após a ocorrência da lesão tecidual, englobando etapas: trombocítica, granulocitica e a macrofágica4. Em seguida, tem-se a fase proliferativa, que possui como característica principal a formação do tecido de granulação. A formação neocapilar sobre influência dos fatores angiogênicos liberados pelos macrófagos, estimulando a migração e proliferação das células endoteliais dos vasos sanguíneos6. Por fim, a fase reparadora ou de maturação, em que ocorre a reorientação das fibras do colágeno, com mudanças no tecido cicatricial4.Curativo é um processo que envolve desde o procedimento de limpeza até a seleção da cobertura específica para determinada lesão, objetivando auxiliar no tratamento da ferida ou prevenir a colonização dos locais de inserção de dispositivos invasivos, sejam diagnósticos ou terapêuticos6.A técnica aplicada durante o curativo deve atender aos princípios que otimizem o processo de cicatrização, constituindo um ponto importante para a boa evolução da ferida. O curativo deve ser realizado de forma asséptica, com o manuseio correto das pinças e a manutenção da técnica asséptica.A escolha do tipo de cobertura a ser utilizada está diretamente relacionada com sua função, que pode ser: proteção e absorção de umidade; absorção de exsudato e odores; desbridamento; limpeza e prevenção da contaminação exógena; compressão para minimizar acúmulo de fluídos; imobilização ou proteção contra traumatismos mecânicos6. A decisão terapêutica deverá ser dinâmica, adaptando-se continuamente à evolução clínica da ferida.Para uma cicatrização adequada é necessário conhecer as coberturas disponíveis no mercado, tal como sua composição, mecanismo de ação, indicação, advertências, modo de usar e intervalo de troca. Há no mercado variedades de produtos com o objetivo de tratar os diferentes tipos de lesões, considerando as diversas fases do processo cicatricial.A decisão sobre o produto vai depender de vários aspectos: recursos financeiros do paciente e instituição, tipo de ferida e necessidade de continuidade do tratamento. Dentre os produtos de última geração, inserem-se: alginato de cálcio, hidrogel, carvão ativado, hidrocolóide, adesivo de hidropolímero, filmes semipermeáveis e cobertura não-aderente estéril, os quais podem ser apresentados de forma associada, segundo o fabricante7.O alginato de cálcio é indicado em feridas cavitária, altamente exsudativas, com ou sem infecção, até a redução do exsutado. Esse produto também é indicado em feridas sangrantes, pela capacidade de promover a hemostasia, além de auxiliar no desbridamento autolítico7.Em feridas superficiais com moderada ou baixa exsudação, com presença de crostas, fibrinas e necrose, o curativo de escolha é o hidrogel, por amolecer o tecido e promover o desbridamento autolítico7.O carvão ativado é indicado em feridas fétidas, infectadas e exsudativas, já que absorve o exsudato e filtra o odor. Além do mais, a prata presente nesse curativo possui ação bactericida7.A cobertura de hidrocolóide estimula a angiogênese e o desbridamento autolítico, sendo indicado em feridas abertas não infectadas, com leve a moderada exsudação, assim como o curativo de hidropolímero. O hidrocolóide também é utilizado na prevenção de fricção e cisalhamento7.Nas lesões em que não há áreas de tecido desvitalizado, estando em processo de granulação, além de o paciente apresentar dor intensa quando a cobertura é retirada pode-se utilizar a não aderente estéril, a qual também é indicada na proteção de tendões e ossos, quando há necessidade de utilização do carvão ativado, tendo como opção, também, o filme semipermeável. Este é utilizado de forma importante nos curativos de cateteres venosos centrais.É essencial que o enfermeiro possua conhecimento referente a esses produtos e esteja ciente sobre sua importância, haja vista que o uso inadequado dos mesmos pode ser prejudicial ao processo cicatricial. O conhecimento é fundamental para o cuidado satisfatório e evolução positiva da ferida.O paciente com feridas deve receber tratamento diferenciado, considerando-se que, geralmente, se encontra fragilizado. A auto-estima afetada, a dura e prolongada recuperação, a perspectiva das complicações e seqüelas são fantasmas que acompanham seu tratamento8.O interesse pela temática justifica-se pela importância da atuação do enfermeiro no tratamento de feridas, sendo relevante sua decisão quanto ao tipo de tratamento e coberturas ideais, assim como às condutas a serem tomadas. Destacase, também, a escassez de estudos relacionados ao tema.O estudo poderá contribuir para uma reflexão sobre a qualidade da assistência de enfermagem aos pacientes com feridas, propiciando uma visão acerca do conhecimento do enfermeiro sobre o tratamento da ferida, assim como dos produtos que podem ser utilizados, direcionando ações voltadas aos pacientes portadores de feridas, buscando sua recuperação mais rápida e melhor qualidade de vida.ObjetivosO objetivo geral do estudo é analisar o conhecimento do enfermeiro acerca das coberturas de última geração. Quanto aos específicos, têm-se: identificar os tipos de coberturas de última geração conhecidos pelos enfermeiros, verificar a indicação de cada cobertura, na visão do enfermeiro, e conhecer a importância dessas coberturas, na opinião dos enfermeiros.MétodosTrata-se de um estudo exploratório descritivo, com abordagem qualitativa, permitindo reunir informações gerais a respeito do tema. Esse tipo de estudo tem como finalidade proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses. O objetivo principal é o aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições9.Foi realizado em uma instituição da rede estadual de saúde, especializada em doenças infectocontagiosas, localizada em Fortaleza-Ceará. A opção pela instituição deu-se pela observação de que todos os enfermeiros, independentemente da unidade de trabalho, realizam curativos, sendo fundamental a familiarização com o procedimento e produtos para uma melhor assistência.Participaram do estudo 21 enfermeiros que trabalham nas diferentes unidades, tendo como critérios de inclusão: estar atuando no hospital há, pelo menos, dois anos e ser plantonista durante o período diurno, visto que o procedimento geralmente é realizado durante o dia; e, como critérios de exclusão: estarem lotados na emergência ou demais setores em que não são realizados curativos.A coleta de dados foi realizada nos meses de março e abril de 2009, a partir de um roteiro de entrevista semi-estruturado, composto de dados sócio-demográficos e questões relacionadas ao conhecimento do enfermeiro sobre os tipos de feridas e coberturas.Os dados foram analisados utilizando-se a análise de conteúdo, que compreende um conjunto de técnicas de análise das comunicações, empenhado em obter indicadores capazes de possibilitar a inferência de conhecimentos acerca dessas mensagens10. A leitura e identificação das unidades significativas levaram à construção de categorias, analisadas à luz da literatura pertinente ao tema.Foram seguidos os princípios contidos na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, referentes à pesquisa envolvendo seres humanos11. O projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa da instituição, sendo aprovado com o protocolo no. 049/2008. Os participantes formalizaram a participação no estudo pela assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, com liberdade de desistência e garantia de anonimato em relação a sua identidade.ResultadosApós a organização e tratamento dos dados, foram estabelecidas três categorias, nas quais os depoimentos foram agrupados conforme a representatividade em relação ao conteúdo abordado.• Ferida: significado e evoluçãoEssa categoria demonstra o conhecimento do enfermeiro em relação ao conceito de ferida, etapas de cicatrização e fatores envolvidos no processo de evolução da lesão.Os enfermeiros foram questionados acerca do significado da palavra ferida, conforme demonstrado nos depoimentos:“Perda da integridade tissular ocasionada por diversos fatores: mecânico, físico, infeccioso, cirúrgico”. (E3)“Descontinuidade da pele, com variação de origem”. (E4)“Alteração na integridade da pele que se inicia com uma hiperemia e eliminação no suprimento sanguíneo até o rompimento da pele”. (E14)Observa-se que os participantes associam geralmente ferida à perda da integridade da pele, corroborando a literatura2. Os mesmos enfocaram, ainda, os fatores causais e a forma como a alteração cutânea acontece.Convém salientar que é importante, também, o conhecimento do enfermeiro sobre os diversos tipos de feridas, associando causa e desenvolvimento, a fim de uma melhor avaliação e sistematização do cuidado, considerando que, dependendo do tipo, a reparação tissular acontecerá de forma distinta, sendo necessária a utilização de um produto específico voltado para a cicatrização.É essencial a compreensão do profissional em relação às etapas do processo cicatricial. Os depoimentos a seguir demonstram a percepção dos profissionais a esse respeito:“As fases da cicatrização... acho que são: hemostasia, inflamação, proliferativa e maturação”. (E1)“Granulação, epitalização, aproximação dos tecidos”. (E6)“Incluem Inflamação, epitelização, granulação,fibroplasia.” (E12)Nota-se uma deficiência no conhecimento acerca das fases da cicatrização, ocorrendo, algumas vezes, inversão das fases ou uso de sinônimos.O processo cicatricial é a capacidade de reconstrução do organismo, com cuidados de desbridamento, limpeza e higiene local. Essa reconstrução ocorre em diferentes fases, cada uma com uma função específica, levando à fase de reparação final12. É fundamental que o profissional tenha conhecimento deste processo, bem como dos fatores que interferem nele, para a implementação de intervenções adequadas, de acordo com cada fase, tipo de ferida e paciente.Outro ponto abordado no estudo, inserido nessa categoria, diz respeito aos fatores interferentes na evolução da ferida, mostrados nos depoimentos a seguir.“Desnutrição, falta de mobilização no leito, infecções, procedimentos utilizados (...) trauma ou não”. (E4)“Intrínsecos: diabetes, estado nutricional, infecção, resposta ao antibiótico. Externos: Tipo de curativo. Fator social: renda, limpeza, higiene”. (E6)“Nutrição, co-morbidades, higiene, grau de consciência (déficit motor, déficit neurológico), presença de diarréia, incontinência urinária.” (E11)Os profissionais consideram que alguns fatores, sejam locais ou sistêmicos, possuem o poder de interferir na evolução da ferida, gerando prejuízo para o processo cicatricial. Entretanto, muitas vezes, não ocorreu uma explicitação em relação aos mesmos.Dentre esses fatores, podem-se citar: pressão exercida na pele (por exemplo, pacientes acamados), infecção, edema, produtos utilizados, técnica correta, presença de desnutrição, medicamentos em uso, estresse fisiológico e história pregressa do paciente (tabagismo, etilismo, doenças pré-existentes).Fatores locais, sistêmicos e externos condicionam o surgimento da ferida ou interferem na cicatrização, como a presença de patologia de base (hipertensão, diabetes mellitus), aspectos nutricionais, infecciosos, medicamentosos e, sobretudo, o rigor e a qualidade do cuidado1.A técnica utilizada para a realização do curativo também foi destacada pelos participantes Rev Estima - Vol 9 (4) 2011 - 17 como interferente na evolução da ferida, aliada a faixa etária e imunidade.“Imunidade, curativo, técnica correta, idade”. (E2; E7)“Fatores biológicos, como a idade. Fatores técnicos: material e medicamento utilizado no tratamento, técnicas de condução do tratamento”. (E12)Os participantes demonstram, a partir dos relatos, que tanto os fatores associados ao paciente, como os fatores inerentes ao procedimento interferem na evolução da ferida, dificultando ou auxiliando a cicatrização.É oportuno destacar que o curativo representa uma terapêutica que consiste na limpeza e aplicação de uma cobertura estéril em uma ferida, quando necessário, para promover a cicatrização e prevenir a contaminação ou infecção, sendo importante a observação rigorosa da técnica13.• Avaliação da ferida: aspectos importantesEssa categoria reflete a visão do enfermeiro sobre os aspectos importantes durante a avaliação de uma ferida. Estes devem ser enfocados pelo profissional no momento de diagnóstico da ferida, envolvendo tipo de ferida, tecido presente no leito da ferida e característica da pele ao redor da ferida, tudo isso contribuindo para a escolha do produto.Os depoimentos, a seguir, trazem os principais aspectos a serem considerados na avaliação da ferida segundo a opinião dos participantes do estudo:“Condições da pele, exsudato, tipo de tecido no leito da ferida, margem, presença de esforço”. (E1)“Extensão e profundidade, características do exsudato, quando presente, presença de esfacelo, tecido necrótico e tecido de granulação”. (E11)“(...) tamanho, presença de secreção, necrose, fibrina, granulação; extensão e profundidade; fatores de risco do paciente como um todo”. (E19)Identificou-se, muitas vezes, que a pele ao redor da ferida é considerada um fator importante na avaliação, além da presença de exsudato e tipo de tecido no leito da ferida. No entanto, os enfermeiros chamaram atenção para o tamanho e a profundidade da lesão.Durante a avaliação de uma ferida, os enfermeiros devem considerar a descrição clínica além do tamanho, pois, apesar da redução da área lesada ser utilizada para julgar a evolução da ferida, às vezes, o aumento de sua extensão após o desbridamento pode indicar a melhora da lesão, pela remoção do tecido desvitalizado14.Ao selecionar uma cobertura, é importante, também, considerar a viscosidade e a quantidade de exsudato presente na ferida, a profundidade da ferida e as condições da pele ao redor15, a qual deve ser inspecionada quanto a sua integridade e fragilidade, devendo, geralmente, ser utilizado, também, algum produto com o intuito de preservar a área.Outros fatores relatados como importantes na avaliação da ferida e seleção do produto referem-se à presença de infecção e à observação acerca do estado nutricional do paciente.“Verifica-se, se está infectada ou não e que tipo de tecido foi atingido para se decidir que tipo de curativo se utilizará”. (E3)“(...) se há infecção, estado nutricional do paciente, se for em um membro verificar se a função está preservada, se há necrose.” (E15)A observação de sinais de infecção na ferida é crucial para a escolha da cobertura. O trabalho da equipe multiprofissional é necessário, pois, quando há infecção, o paciente deve ser tratado com antimicrobianos, sendo essencial, também, a ênfase no aspecto nutricional.A grande complicação das feridas é sua infecção, envolvendo diversos fatores predisponentes. Os locais são: contaminação, presença de corpo estranho, técnica de sutura inadequada, tecido desvitalizado, hematoma e espaço morto. Os gerais contribuem para aumentar a infecção, incluindo: debilidade, idade avançada, obesidade, anemia, choque, grande período de internação hospitalar, tempo cirúrgico elevado, e doenças associadas principalmente diabetes e doenças imunodepressoras16.• Coberturas de última geração: conhecimento do enfermeiroEssa categoria enfoca o conhecimento dos entrevistados quanto às coberturas de última geração, envolvendo os tipos, indicações, vantagens e desvantagens dos mesmos.Quando questionados sobre os parâmetros utilizados para a escolha do produto, os enfermeiros destacam a avaliação do estágio da ferida e de suas características como fundamentais:“Após avaliação da ferida (...), seu estágio e estado.” (E6; E16)“Através da quantidade de exsudato e da sua camada ou tipo de tecido atingido”. (E9)“De acordo com as características da ferida”. (E11; E14; E21)Observa-se, nos relatos, a associação clara entre o estágio da ferida e a escolha do produto, todavia, questiona-se a aptidão do profissional para estabelecer o estágio da ferida.A familiaridade com os numerosos tipos de coberturas disponíveis atualmente aumenta a chance de escolher a cobertura ideal para uma ferida particular. Ajustar a cobertura ao paciente, ferida e situação requer raciocínio clínico. A escolha adequada da cobertura requer uma acurada avaliação da ferida e identificação cuidadosa do estágio de cicatrização17.Alguns depoimentos associaram a escolha do produto para o procedimento à disponibilidade na instituição ou à prescrição médica e não ao estágio de cicatrização ou às características da ferida:“(...) pelo o que o hospital oferece”. (E5)“Conforme prescrição.” (E8)As instituições hospitalares, em geral, não dispõem de variedades de coberturas, limitandose a pomadas enzimáticas ou soro fisiológico. Tal fato ocorre em virtude do preço das coberturas, que é relativamente alto. Entretanto, quando considerada a relação custo/benefício, há uma economia de materiais de consumo e recursos humanos, tendo em vista a promoção da cicatrização e otimização das horas de trabalho dos profissionais.Por meio do depoimento de um dos entrevistados, verificou-se que a escolha do produto foi baseada em orientação do estomaterapeuta:“Seleciono o produto que vou usar no curativo pela orientação da estomaterapeuta”. (E4)Observou-se que a indicação do produto está associada a diversos fatores, incluindo a fase de cicatrização, disponibilidade e orientação de um profissional capacitado. No entanto, não estiveram presentes, nas respostas dos enfermeiros, a indicação dos tipos de coberturas de última geração com base no tipo de ferida, tecido no leito da mesma e presença de exsudato.Atualmente, na enfermagem, vem se difundindo a especialização na área de estomaterapia, destinada ao tratamento de pessoas com feridas, estomias e incontinências. Nos hospitais, esse profissional ocupa função importante, uma vez que pode proporcionar a sistematização no tratamento de feridas, pois está preparado para tomar decisões nessas áreas.Todavia, convém enfatizar que, nas instituições hospitalares, nem sempre existe esse profissional, cabendo ao enfermeiro assistencial a avaliação da ferida e indicação do produto, dependendo da oferta da instituição.Os enfermeiros, estomaterapeutas ou não, são responsáveis pela monitorização da ferida, através da avaliação periódica, documentando a assistência prestada. Para tanto, é imprescindível a atualização contínua, a fim de acompanhar os avanços técnicos e científicos referentes ao processo fisiológico da reparação tecidual, possibilitando a boa avaliação da ferida18. Atualmente, são inúmeras as opções de coberturas existentes no mercado. A grande variedade de coberturas industrializadas possibilita melhor adequação e manejo das diversas condições das feridas.Os produtos mais citados pelos enfermeiros participantes do estudo, por ordem decrescente, foram: alginato de cálcio, carvão ativado, ácido graxo essencial (AGE), hicrocolóide e hidrogel. O filme transparente foi citado em menor proporção.Dentre os outros produtos listados, temse: papaína, aloe vera, sulfadiazina de prata e polímeros.Quando questionados sobre a importância dos produtos de última geração, os enfermeiros relataram:“A qualidade de vida do paciente, recuperação mais rápida, menos risco de infecção, menor manuseio da lesão”. (E8)“ (...) conforto para o paciente, já que alguns podem permanecer por 3 a 7 dias sem trocar; facilitar e agilizar a cicatrização da ferida.” (E11)“Favorece cicatrização da ferida. Diminui o tempo de permanência do paciente no serviço.” (E18)Os profissionais estão cientes quanto à importância dos produtos para o paciente e para a ferida, ressaltando sua cicatrização mais rápida, além do conforto e bem estar dos pacientes.As coberturas biológicas mantêm o meio úmido no leito da ferida, além de promover autólise e facilitar a cicatrização. Tais produtos proporcionam maior conforto ao paciente, pelo menor número de trocas, além de acelerar o processo de cicatrização, tornando o tratamento menos oneroso13.As vantagens dos produtos são traduzidas, também, pela otimização do trabalho dos profissionais responsáveis pela realização do curativo:“Redução do internamento, redução da dor, economia de tempo para enfermeiro”. (E16)Quando se elege o produto mais indicado para determinada ferida, proporciona-se melhor evolução da mesma, além de aproveitamento das horas de trabalho dos enfermeiros, pois a periodicidade de troca dos curativos, algumas vezes e dependendo do produto, não é diária.Frente aos depoimentos dos enfermeiros, parece haver um conhecimento a respeito da importância e tipos de coberturas de última geração. Por outro lado, o conhecimento sobre as fases de cicatrização das feridas é deficitário, o que pode influenciar fortemente na escolha do produto a ser utilizado.O depoimento abaixo mostra a utilização de produtos especiais para valorizar as ações de enfermagem no tratamento de feridas:“Tem importância para valorizar a ação de Enfermagem sistematizada.” (E19)A sistematização da assistência de enfermagem (SAE) visa a proporcionar melhoria significativa da qualidade da assistência ao paciente através do planejamento individualizado das ações de enfermagem pelo enfermeiro, permitindo a continuidade e a integralidade do cuidado.É importante a formação de profissionais especializados no tratamento de feridas, nas diversas instituições, com funções especificas de orientar práticas diferenciadas de tratamento, coibir tratamentos empíricos e comprovadamente prejudiciais ao processo de cicatrização, além de adequar os custos conforme a situação econômica vigente6.Apesar da identificação de diversas vantagens das coberturas de última geração, obtiveram-se depoimentos que expressam suas desvantagens:“Técnicas de conhecimento, produtos de valor elevado (...) uso incorreto do produto”. (E16; E18)“Falta de profissionais para atuarem em educação nos hospitais (...) desvinculação dos laboratórios. Custo”. (E19)“Deveria haver pessoas especialistas para utilizar de forma correta esses curativos.” (E20)Apreende-se que as desvantagens se associam principalmente ao custo elevado dos produtos. Porém, fica evidenciada, também, a necessidade de treinamento em serviço, para que os profissionais conheçam, de forma mais aprofundada, os tipos de coberturas, indicações e técnicas de manuseio.O acesso dos profissionais a recursos materiais adequados e a treinamentos específicos, além do desenvolvimento de um trabalho interdisciplinar são fatores indispensáveis para viabilizar as condições necessárias para o estabelecimento de condutas terapêuticas eficazes1.O preço é um aspecto relevante a ser considerado e algumas coberturas são caras. Porém, redução do tempo de cicatrização e do período de hospitalização, redução das trocas das coberturas e, consequentemente, dos gastos nesse período são relevantes na avaliação de custo-benefício7.Considerações finaisA partir dos resultados, ressalta-se a necessidade de maior esclarecimento em relação ao desenvolvimento da lesão e das fases envolvidas em sua recuperação, aos enfermeiros, pois, para uma prescrição adequada do produto, é essencial a avaliação minuciosa.Em relação aos fatores que interferem na evolução da ferida, identificou-se que o conhecimento dos enfermeiros envolve aspectos gerais, sejam locais ou sistêmicos, como também aspectos intrínsecos ao paciente, tais como doenças pré-existentes, especialmente o Diabetes mellitus. Percebeu-se, também, um destaque para a avaliação do tamanho e profundidade da ferida.Os produtos de última geração foram citados, porém, existe muita dúvida por parte dos profissionais quanto a indicação e formas de utilização. Esses produtos eventualmente são utilizados na instituição enfocada no estudo, porém a mesma não dispõe dos mesmos como rotina.A seleção do produto mais adequado para determinada ferida foi justificada com base na avaliação do estágio da ferida. Nesse sentido, é fundamental que o enfermeiro conheça, de forma aprofundada, os tipos de tecidos presente em cada lesão, assim como a função de cada produto.Convém ressaltar que feridas diferentes tem necessidades diferentes, pois apresentam processo específico de cicatrização. Assim, a avaliação criteriosa da ferida é imprescindível para a escolha do tipo de cobertura, associando-se à fisiologia da cicatrização e aos elementos que prejudicam esse processo.Some-se a isso a necessidade de conhecimento, por parte do enfermeiro, da técnica de realização de curativo, bem como dos produtos novos, frente à avançada tecnologia científica.Muitos enfermeiros ainda demonstram déficit de conhecimento nesse campo, sendo essencial o aprofundamento e aperfeiçoamento na área.

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Referências

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Publicado

2016-03-23

Como Citar

1.
Melo EM, Fernandes VS. Artigo Original 1. ESTIMA [Internet]. 23º de março de 2016 [citado 22º de novembro de 2024];9(4). Disponível em: https://www.revistaestima.com.br/estima/article/view/69

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